Lista de pontos

Há 2 pontos em "Amigos de Deus", cuja matéria seja Desprendimento → exercícios de desprendimento.

Temos que ser exigentes conosco na vida cotidiana, para não inventar falsos problemas, necessidades artificiais que, em último termo, procedem da arrogância, do capricho, de um espírito comodista e preguiçoso. Devemos caminhar para Deus a passo rápido, sem bagagem e sem pesos mortos que dificultem a marcha. Precisamente porque o espírito de pobreza não consiste em não ter, mas em estar verdadeiramente desapegado, devemos permanecer atentos para não nos enganarmos com imaginários motivos de força maior. Buscai o suficiente, buscai o que basta. E não queirais mais. O que passa disso é aflição, não alívio; acabrunha, em vez de levantar.

Ao descer a estes conselhos, não me baseio em situações estranhas, anormais ou complicadas. Sei de alguém que, para marcar os livros, usava uns papéis em que escrevia umas jaculatórias que o ajudassem a manter a presença de Deus. E entrou-lhe o desejo de conservar com carinho aquele tesouro, até que percebeu que se estava apegando a uns papeluchos de nada. Que belo modelo de virtude! Não me importaria de vos manifestar todas as minhas misérias, se vos servisse para alguma coisa. Levantei um pouco o véu porque talvez contigo se passe outro tanto: os teus livros, a tua roupa, a tua mesa, os teus… ídolos de quinquilharia.

Em casos como esses, recomendo-vos que consulteis o vosso diretor espiritual, sem ânimo pueril nem escrupuloso. Às vezes, bastará como remédio a pequena mortificação de prescindir do uso de alguma coisa durante uma breve temporada. Ou, noutra ordem, não morre ninguém se um dia renuncias ao meio de transporte que utilizas habitualmente e entregas como esmola a quantia poupada, mesmo que seja muito pouco dinheiro. De qualquer modo, se tens espírito de desprendimento, não deixarás de descobrir contínuas ocasiões, discretas e eficazes, de praticá-lo.

Depois de vos abrir a minha alma, preciso confessar-vos também que tenho um apego a que não quereria renunciar nunca: o de amar-vos de verdade a todos vós. Aprendi-o do melhor Mestre, e gostaria de seguir fidelissimamente o seu exemplo, amando sem limites as almas, a começar pelos que me rodeiam. Não vos comove essa caridade ardente - esse carinho - de Jesus Cristo, que o Evangelista nos revela ao designar um dos discípulos? Quem diligebat Iesus, aquele a quem Jesus amava.

Terminamos com uma consideração que nos oferece o Evangelho da Missa de hoje: Seis dias antes da Páscoa, Jesus foi a Betânia, onde tinha morrido Lázaro, que Jesus ressuscitara. E prepararam-lhe lá uma ceia; e Maria servia, e Lázaro era um dos que estavam à mesa com Ele. Então Maria tomou uma libra de bálsamo feito de nardo puro de grande preço, e derramou-o sobre os pés de Jesus, e enxugou-lhe os pés com os seus cabelos, e a casa toda ficou cheia do perfume do bálsamo. Que prova tão clara de magnanimidade o excesso de Maria! Judas lamenta-se de que se tivesse deitado a perder um perfume que valia - na sua cobiça, fez muito bem os cálculos - pelo menos trezentos denários.

O verdadeiro desprendimento leva-nos a ser muito generosos com Deus e com os nossos irmãos; a mexer-nos, a procurar recursos, a gastar-nos para ajudar os que passam necessidade. Não pode um cristão conformar-se com um trabalho que lhe permita ganhar o suficiente para viver ele e os seus. A sua grandeza de coração arrastá-lo-á a meter ombros para sustentar os outros, por um motivo de caridade, e também por um motivo de justiça, como escrevia São Paulo aos de Roma: A Macedônia e a Acaia tiveram por bem fazer uma coleta para os pobres que existem entre os santos de Jerusalém. Tiveram-no por bem, porque lhes são devedores. Com efeito, se os gentios se tornaram participantes dos bens espirituais dos judeus, devem por sua vez assisti-los com os temporais.

Não sejais mesquinhos nem tacanhos com quem tão generosamente se excedeu conosco, até se entregar totalmente, sem medida. Pensai: quanto vos custa - também economicamente - ser cristãos? Mas sobretudo não esqueçais que Deus ama quem dá com alegria. De resto, Deus é poderoso para cumular-vos de todos os bens, de sorte que, contentes sempre de ter em todas as coisas o suficiente, estejais com folga para praticar todo o tipo de obras boas.

Ao aproximarmo-nos, durante esta Semana Santa, das dores de Jesus Cristo, vamos pedir à Santíssima Virgem que, como Ela, também nós saibamos ponderar e conservar todos estes ensinamentos no nosso coração.