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Há 4 pontos em "É Cristo que passa", cuja matéria seja Fraqueza humana .

A guerra do cristão é incessante, porque na vida interior se verifica um perpétuo começar e recomeçar, que nos impede de orgulhosamente nos imaginarmos perfeitos. É inevitável que haja muitas dificuldades no nosso caminho; se não encontrássemos obstáculos, não seríamos criaturas de carne e osso. Sempre teremos paixões que nos puxem para baixo, e sempre precisaremos defender-nos contra esses delírios mais ou menos veementes.

Perceber no corpo e na alma o aguilhão da soberba, da sensualidade, da inveja, da preguiça, do desejo de subjugar os outros, não deveria representar uma descoberta. É um mal antigo, sistematicamente confirmado pela nossa experiência pessoal; é o ponto de partida e o ambiente habitual do nosso esforço por ganhar, num íntimo desporto, a nossa corrida para a casa do Pai. Por isso nos ensina São Paulo: Quanto a mim, corro, não como que à aventura; luto, não como quem açoita o ar; mas castigo o meu corpo e conservo-o na escravidão, não suceda que, tendo pregado aos outros, venha eu a ser condenado.

Para iniciar ou sustentar esta contenda, o cristão não deve esperar por manifestações exteriores ou sentimentos favoráveis. A vida interior não é questão de sentimentos, mas de graça divina e de vontade, de amor. Todos os discípulos foram capazes de seguir Cristo no seu dia de triunfo em Jerusalém, mas quase todos o abandonaram à hora do opróbrio da Cruz

Para amar de verdade, precisamos ser fortes, leais, com o coração firmemente ancorado na fé, na esperança e na caridade. Só a ligeireza insubstancial muda caprichosamente de objeto em seus amores, que não são amores, mas compensações egoístas. Quando há amor, há integridade: capacidade de entrega, de sacrifício, de renúncia. E, no meio da entrega, do sacrifício e da renúncia - com o suplício da contradição -, a felicidade e a alegria. Uma alegria que nada nem ninguém nos poderá tirar.

Neste torneio de amor, não nos devem entristecer as nossas quedas, nem mesmo as quedas graves, se recorremos a Deus com dor e bom propósito, mediante o sacramento da Penitência. O cristão não é nenhum colecionador maníaco de uma folha de serviços imaculada. Jesus Cristo Nosso Senhor não só se comove com a inocência e a fidelidade de João, como se enternece com o arrependimento de Pedro depois da queda. Jesus compreende a nossa debilidade e atrai-nos a Si como que por um plano inclinado, desejando que saibamos insistir no esforço de subir um pouco, dia após dia. Procura-nos como procurou os discípulos de Emaús, indo ao seu encontro; como procurou Tomé e lhe mostrou as chagas abertas nas mãos e no lado, fazendo com que as tocasse com seus dedos. Jesus Cristo está sempre à espera de que voltemos para Ele, precisamente porque conhece a nossa fraqueza.

Suporta as dificuldades como um bom soldado de Cristo Jesus , diz-nos São Paulo. A vida do cristão é milícia, guerra, uma formosíssima guerra de paz, que em nada se identifica com as empresas bélicas humanas, porque estas se inspiram na divisão e muitas vezes nos ódios, e a guerra dos filhos de Deus contra o seu próprio egoísmo se baseia na unidade e no amor. Vivemos na carne, mas não militamos por motivos carnais. Porque as armas da nossa milícia não são carnais, mas sim a fortaleza em Deus para derrubar fortalezas, desbaratando com elas os projetos humanos e toda a altivez que se levanta contra a ciência de Deus. É a escaramuça sem tréguas contra o orgulho, contra a prepotência que nos induz a praticar o mal, contra os juízos altaneiros.

Neste Domingo de Ramos, em que Nosso Senhor inicia a semana decisiva para a nossa salvação, deixemo-nos de considerações superficiais e fixemos o olhar no que é verdadeiramente importante. Vejamos bem: o que realmente devemos pretender é ir para o céu. Senão, nada vale a pena. E se queremos ir para o céu, é indispensável sermos fiéis à doutrina de Cristo; e para sermos fiéis, é indispensável porfiarmos com constância na luta contra os obstáculos que se opõem à nossa felicidade eterna.

Sei que a idéia de combate evoca imediatamente a nossa fraqueza, e prevemos as quedas, os erros. Deus conta com isso. É inevitável que, ao caminharmos, levantemos poeira. Somos criaturas e estamos cheios de defeitos. Eu diria até que os teremos sempre; são as sombras que fazem ressaltar mais em nossa alma a graça de Deus e as nossas tentativas de corresponder ao favor divino. E esse claro-escuro nos tornará humanos, humildes, compreensivos, generosos.

Não nos enganemos: se na nossa vida contamos com o nosso brio e com vitórias, devemos contar também com desfalecimentos e derrotas. Essa foi sempre a peregrinação terrena dos cristãos, mesmo dos que veneramos hoje nos altares. Lembramo-nos de Pedro, de Agostinho, de Francisco? Nunca me agradaram essas biografias de santos que, com toda a ingenuidade, mas também com falta de doutrina, nos apresentavam as façanhas desses homens como se tivessem sido confirmados na graça desde o seio materno. Não. As verdadeiras biografias dos heróis cristãos são como as nossas vidas: lutavam e ganhavam, lutavam e perdiam. E então, contritos, voltavam à luta.

Não nos estranhe sermos derrotados com relativa freqüência, geralmente ou até sempre em matérias de pouca importância, que nos ferem como se tivessem muita. Se há amor de Deus, se há humildade, se há perseverança e tenacidade em nossa milícia, essas derrotas não terão excessiva importância, porque chegarão as vitórias, que serão glória aos olhos de Deus. Não existem fracassos quando nos portamos com intenção reta e com o propósito de cumprir a vontade de Deus, contando sempre com a sua graça e o nosso nada.

Fé, pois, sem permitir que o desalento nos domine, sem nos determos em cálculos meramente humanos. Para vencer os obstáculos, é necessário começar por trabalhar, mergulhar de corpo e alma na tarefa, de tal maneira que o próprio esforço nos leve a abrir novos caminhos. Perante qualquer dificuldade, esta é a panacéia: santidade pessoal, entrega ao Senhor.

A santidade consiste em viver tal como nosso Pai dos céus dispôs que vivêssemos. É difícil? Sim, o ideal é muito elevado. Mas, por outro lado, é fácil: está ao alcance da mão. Quando uma pessoa adoece, acontece às vezes que não se consegue encontrar o remédio adequado. No terreno sobrenatural, não é assim. O remédio está sempre junto de nós: é Cristo Jesus, presente na Sagrada Eucaristia, que nos dá, além disso, a sua graça através dos outros Sacramentos que instituiu.

Repitamos com a palavra e com as obras: Senhor, confio em Ti, basta-me a tua providência ordinária, a tua ajuda de cada dia. Não é questão de pedir a Deus grandes milagres. Devemos, antes, pedir-lhe que aumente a nossa fé, que ilumine a nossa inteligência, que fortaleça a nossa vontade. Jesus permanece sempre junto de nós, e comporta-se sempre como quem é.

Desde o começo da minha pregação, tenho prevenido contra um falso endeusamento. Não te perturbes se te conheces tal como és: assim, de barro. Não te preocupes. Porque tu e eu somos filhos de Deus - eis o endeusamento bom -, escolhidos pela chamada divina desde toda a eternidade: Escolheu-nos o Pai, por Jesus Cristo, antes da criação do mundo, para que sejamos santos na sua presença. Nós, que pertencemos especialmente a Deus, que somos seus instrumentos apesar da nossa pobre miséria pessoal, seremos eficazes se não perdermos o conhecimento da nossa fraqueza. As tentações dão-nos a dimensão da nossa própria fragilidade.

Se nos sentimos abatidos, por experimentarmos - talvez de um modo particularmente vivo - a nossa mesquinhez, é o momento de nos abandonarmos por completo, com docilidade, nas mãos de Deus. Conta-se que, certo dia, um mendigo saiu ao encontro de Alexandre Magno e pediu-lhe uma esmola. Alexandre deteve-se e ordenou que o fizessem senhor de cinco cidades. O pobre, confuso e aturdido, exclamou: “Eu não pedia tanto!” E Alexandre respondeu: “Tu pediste como quem és; eu te dou como quem sou”.

Mesmo nos momentos em que percebemos mais profundamente a nossa limitação, podemos e devemos olhar para Deus Pai, para Deus Filho e para Deus Espírito Santo, sabendo-nos participantes da vida divina. Não há nunca motivo suficiente para voltarmos a cara para trás : o Senhor está ao nosso lado. Temos que ser fiéis, leais, fazer frente às nossas obrigações, encontrando em Jesus o amor e o estímulo para compreender os erros dos outros e vencer os nossos próprios erros. Assim, todos esses abatimentos - os teus, os meus, os de todos os homens -, servirão também de suporte para o reino de Cristo.

Reconheçamos as nossas mazelas, mas confessemos o poder de Deus. O otimismo, a alegria, a convicção firme de que o Senhor quer servir-se de nós, têm de informar a vida cristã. Se nos sentimos parte da Igreja Santa, se nos consideramos sustentados pela rocha firme de Pedro e pela ação do Espírito Santo, decidir-nos-emos a cumprir o pequeno dever de cada instante: a semear cada dia um pouco. E a colheita fará transbordar os celeiros.

Como és grande, Senhor nosso Deus! Tu és quem dá à nossa vida sentido sobrenatural e eficácia divina. Tu és a causa de que, por amor de teu Filho, possamos repetir com todas as forças do nosso ser, com a alma e com o corpo: Convém que Ele reine!, enquanto ressoa a canção da nossa fraqueza, pois sabes que somos criaturas - e que criaturas! - feitas de barro, não apenas nos pés , mas também no coração e na cabeça. De forma divina, vibraremos exclusivamente por Ti.

Cristo deve reinar, acima de tudo, na nossa alma. Mas que resposta lhe daríamos se nos perguntasse: como me deixas reinar em ti? Eu lhe responderia que, para que Ele reine em mim, necessito da sua graça abundantemente: só assim é que o último latejo do coração, o último alento, o olhar menos intenso, a palavra mais intranscendente, a sensação mais elementar se traduzirão num hosanna ao meu Cristo Rei.

Se pretendemos que Cristo reine, temos que ser coerentes, começando por entregar-lhe o nosso coração. Se não o fizermos, falar do reinado de Cristo será palavreado sem substância cristã, manifestação externa de uma fé inexistente, manejo fraudulento do nome de Deus para barganhas humanas.

Se a condição para que Jesus reine em minha alma, na tua alma, fosse contar previamente com um lugar perfeito dentro de nós, teríamos motivos para desesperar. Mas não temas, filha de Sião: eis que o teu Rei vem montado sobre um jumentinho. Vemos? Jesus contenta-se com um pobre animal por trono. Não sei o que se passa convosco; quanto a mim, não me humilha reconhecer-me aos olhos do Senhor como um jumento: Sou como um burrinho diante de Ti; mas estarei sempre a teu lado, porque me tomaste pela tua mão direita , Tu me conduzes pelo cabresto.

Pensemos nas características do jumento, agora que vão ficando tão poucos. Não no burro velho e teimoso, rancoroso, que se vinga com um coice traiçoeiro, mas no burrinho jovem, de orelhas esticadas como antenas, austero na comida, duro no trabalho, de trote decidido e alegre. Há centenas de animais mais belos, mais hábeis e mais cruéis. Mas Cristo escolheu esse para se apresentar como rei diante do povo que o aclamava. Porque Jesus não sabe o que fazer com a astúcia calculista, com a crueldade dos corações frios, com a formosura vistosa mas oca. Nosso Senhor ama a alegria de um coração jovem, o passo simples, a voz sem falsete, os olhos limpos, o ouvido atento à sua palavra de carinho. É assim que reina na alma.

Referências da Sagrada Escritura
Referências da Sagrada Escritura