Lista de pontos

Há 4 pontos em "Amigos de Deus", cuja matéria seja Plano de Vida.

Vida interior. Santidade nas tarefas habituais, santidade nas pequenas coisas, santidade no trabalho profissional, nas ocupações de cada dia…; santidade, para santificar os outros.

Sonhava certa vez um conhecido meu - nunca acabo de conhecê-lo bem! - que voava num avião a muita altura, mas não lá dentro, na cabine; ia montado sobre as asas. Pobre infeliz! Como sofria e se angustiava! Parecia que Nosso Senhor lhe dava a entender que assim andam pelas alturas de Deus - inseguras, angustiadas - as almas apostólicas que não têm vida interior ou a descuram: com o perigo constante de cair, sofrendo, incertas.

E penso, efetivamente, que correm um sério perigo de desencaminhar-se aqueles que se lançam à ação - ao ativismo! - e prescindem da oração, do sacrifício e dos meios indispensáveis para conseguir uma sólida piedade: a freqüência de Sacramentos, a meditação, o exame de consciência, a leitura espiritual, o trato assíduo com a Virgem Santíssima e com os Anjos da Guarda… Todos esses meios contribuem, além disso, com uma eficácia insubstituível, para que seja tão amável a jornada do cristão, porque da sua riqueza interior fluem a doçura e a felicidade de Deus, como do favo escorre o mel.

Na intimidade pessoal, na conduta externa, na vida de relação, no trabalho, cada um há de procurar manter-se em contínua presença de Deus, com uma conversação - um diálogo - que não se manifesta por fora; ou melhor, não se expressa geralmente com ruído de palavras, mas terá que notar-se pelo empenho e pela amorosa diligência com que procuraremos acabar bem as tarefas, tanto as importantes como as mais comuns. Se não nos comportarmos com essa firmeza, seremos pouco conseqüentes com a nossa condição de filhos de Deus, porque teremos desperdiçado os recursos que o Senhor colocou providencialmente ao nosso alcance, para que arribemos ao estado do varão perfeito, à medida da idade perfeita segundo Cristo.

Durante a última guerra espanhola, viajava eu com freqüência, para atender sacerdotalmente muitos rapazes que se encontravam nas frentes de batalha. E certa vez escutei numa trincheira um diálogo que me ficou muito gravado. Perto de Teruel, um soldado moço dizia de outro, pelos vistos um pouco indeciso, pusilânime: Esse não é homem de uma só peça! Causar-me-ia uma enorme tristeza que de qualquer um de nós se pudesse afirmar, com fundamento, que é inconseqüente, homem que assegura querer ser autenticamente cristão, santo, mas que despreza os meios adequados, já que no cumprimento das suas obrigações não manifesta continuamente a Deus o seu carinho e o seu amor filial. Se a nossa atuação se desenhasse nesses termos, também nem tu nem eu seríamos cristãos de uma só peça.

Permiti-me que martele em vós, uma vez após outra, o caminho que Deus espera que cada um percorra, quando nos chama a servi-lo no meio do mundo, para santificar e santificar-nos através das ocupações habituais. Com um senso comum fantástico, e ao mesmo tempo cheio de fé, pregava São Paulo: Na lei de Moisés está escrito: Não ponhas mordaça ao boi que debulha. E interroga-se: Porventura Deus tem cuidado dos bois? Não é antes por nós mesmos que Ele o diz? Sim, é por nossa causa que se escrevem estas coisas; porque quem lavra deve lavrar com esperança; e quem debulha deve fazê-lo com a esperança de participar dos frutos.

A vida cristã jamais se reduziu a um entrançado aflitivo de obrigações, que deixa a alma submetida a uma tensão exasperante. Amolda-se às circunstâncias individuais como uma luva à mão, e pede que no exercício das nossas tarefas habituais, nas grandes e nas pequenas, com a oração e a mortificação, não percamos jamais o “ponto de mira” sobrenatural. Pensai que Deus ama apaixonadamente as suas criaturas, e, aliás…, como é que trabalhará o burro se não lhe dão de comer nem dispõe de algum tempo para restaurar as forças, ou se lhe quebram o vigor com excessivas pauladas? O teu corpo é como um burrico - um burrico foi o trono de Deus em Jerusalém - que te leva ao lombo pelas veredas divinas da terra: é preciso dominá-lo para que não se afaste das sendas de Deus, e animá-lo para que o seu trote seja tão alegre e brioso quanto é possível esperar de um jumento.

Volta de novo a contemplar a tua vida e pede perdão por esse detalhe e por aquele outro que saltam imediatamente aos olhos da tua consciência; pelo mau uso que fazes da língua; por esses pensamentos que giram continuamente em redor de ti mesmo; por esse juízo crítico consentido que te preocupa tolamente, causando-te uma perene inquietação e desassossego… Podemos ser muito felizes! O Senhor nos quer contentes, bêbados de alegria, avançando pelos mesmos caminhos de ventura que Ele percorreu! Só nos sentimos infelizes quando nos empenhamos em desencaminhar-nos e enveredamos pela senda do egoísmo e da sensualidade; e muito pior ainda se nos enfiamos pela dos hipócritas.

O cristão há de manifestar-se autêntico, veraz, sincero em todas as obras. A sua conduta deve deixar transparecer um espírito: o de Cristo. Se alguém neste mundo tem obrigação de se mostrar conseqüente, é o cristão, porque recebeu em depósito - para fazer frutificar esse dom - a verdade que liberta, que salva. Padre, perguntar-me-eis, e como conseguirei essa sinceridade de vida? Jesus Cristo entregou à sua Igreja todos os meios necessários: ensinou-nos a rezar, a ganhar intimidade com seu Pai celestial; enviou-nos o seu Espírito, o Grande Desconhecido, que atua na nossa alma; e deixou-nos esses sinais visíveis da graça que são os Sacramentos. Usa-os. Intensifica a tua vida de piedade. Faz oração todos os dias. E não afastes nunca os teus ombros da carga prazerosa da Cruz do Senhor.

Foi Jesus quem te convidou a segui-lo como bom discípulo, a fim de que realizes a tua travessia pela terra semeando a paz e o gáudio que o mundo não pode dar. Para isso - insisto -, temos que andar sem medo à vida e sem medo à morte, sem nos esquivarmos a qualquer custo à dor, que para um cristão é sempre meio de purificação e ocasião de amar deveras os seus irmãos, aproveitando as mil circunstâncias da vida corrente.

Esgotou-se o tempo. Tenho que pôr ponto final a estas considerações com que tentei remexer a tua alma para que correspondesses concretizando alguns propósitos, poucos, mas bem determinados. Pensa que Deus te quer contente e que, se tu fazes da tua parte o que podes, serás feliz, muito feliz, felicíssimo, ainda que em momento nenhum te falte a Cruz. Porém, essa Cruz já não será um patíbulo, mas o trono do qual reina Cristo.

E a seu lado encontrarás Maria, sua Mãe, Mãe nossa também. A Virgem Santa te alcançará a fortaleza de que necessitas para caminhar com decisão, seguindo os passos do seu Filho.

Referências da Sagrada Escritura
Referências da Sagrada Escritura