Lista de pontos

Há 4 pontos em "Amigos de Deus", cuja matéria seja Igreja → fidelidade e liberdade.

Permiti-me uma breve digressão, que vem perfeitamente ao caso. Jamais perguntei a nenhum dos que se aproximaram de mim o que pensava em matéria de política: não me interessa! Com essa norma da minha conduta, manifesto-vos uma realidade que está metida no âmago do Opus Dei, a que com a graça e a misericórdia divinas me dediquei completamente, para servir a Igreja Santa. Esse tema não me interessa, porque vós, cristãos, gozais da mais plena liberdade, com a conseqüente responsabilidade pessoal, para intervir como mais vos aprouver em questões de índole política, social, cultural…, sem outros limites que os estabelecidos pelo Magistério da Igreja. Só ficaria preocupado - pelo bem das vossas almas - se saltásseis essas fronteiras, já que teríeis criado uma nítida oposição entre a fé que afirmais professar e as vossas obras, e então eu vo-lo faria notar claramente. Este sacrossanto respeito pelas vossas opções, enquanto não vos afastarem da lei de Deus, não o entendem os que ignoram o verdadeiro conceito da liberdade que Cristo nos ganhou na Cruz - qua libertate Christus nos liberavit, da liberdade com que Cristo nos libertou -, os sectários de um e outro extremo: esses que pretendem impor como dogmas as suas opiniões temporais; ou os que degradam o homem, ao negarem o valor da fé colocando-a à mercê dos erros mais brutais.

A nossa Santa Mãe a Igreja pronunciou-se sempre pela liberdade e rejeitou todos os fatalismos, antigos e menos antigos. Esclareceu que cada alma é dona do seu destino, para bem ou para mal: E os que não se afastaram do bem irão para a vida eterna; os que praticaram o mal, para o fogo eterno. Sempre nos impressiona esta terrível capacidade que possuímos tu e eu - que todos possuímos -, e que revela ao mesmo tempo o sinal da nossa nobreza. A tal ponto o pecado é um mal voluntário, que de modo algum seria pecado se não tivesse o seu princípio na vontade. Esta afirmação goza de tal evidência que nela estão de acordo os poucos sábios e os muitos ignorantes que habitam o mundo.

Volto a levantar o coração em ação de graças ao meu Deus, ao meu Senhor, porque nada o impedia de nos ter criado impecáveis, com um impulso irresistível para o bem, mas considerou queseriam melhores os seus servidoresse livremente o servissem. Como é grande o amor, a misericórdia do nosso Pai! Em face da evidência das suas loucuras divinas pelos seus filhos, quereria ter mil bocas, mil corações mais, que me permitissem viver num contínuo louvor a Deus Pai, a Deus Filho, a Deus Espírito Santo.

Pensemos que o Todo-Poderoso, Aquele que governa o Universo através da sua Providência, não deseja servos forçados, prefere filhos livres. Introduziu na alma de cada um de nós - embora tenhamos nascido proni ad peccatum, inclinados ao pecado, devido à queda dos nossos primeiros pais - uma centelha da sua inteligência infinita, a atração pelo que é bom, uma ânsia de paz perdurável. E faz-nos compreender que a verdade, a felicidade e a liberdade se alcançam quando procuramos que germine em nós essa semente de vida eterna.

Deus fez o homem desde o princípio e o deixou nas mãos do seu livre arbítrio (Ecclo XV, 14). Isto não aconteceria se não tivesse o poder de optar livremente. Somos responsáveis perante Deus por todas as ações que praticamos livremente. Não são possíveis aqui os anonimatos; o homem encontra-se diante do seu Senhor, e depende da sua vontade resolver-se a viver como amigo ou como inimigo. Assim começa o caminho da luta interior, que é tarefa para toda a vida, porque, enquanto durar a nossa passagem pela terra, ninguém terá alcançado a plenitude da sua liberdade.

A nossa fé cristã, além disso, leva-nos a assegurar a todos um clima de liberdade, começando por afastar qualquer tipo de enganosas coações na apresentação da fé. Se somos levados à força para Cristo, cremos sem querer; usa-se então de violência, não de liberdade. Sem o querer, pode uma pessoa entrar na Igreja; sem o querer, pode aproximar-se do altar; pode, sem o querer, receber o Sacramento. Mas só pode crer quem quer. É evidente que, tendo-se chegado ao uso da razão, é necessária a liberdade pessoal para entrar na Igreja e para corresponder aos contínuos chamados que o Senhor nos dirige.

Continua a cena evangélica: E enviaram os seus discípulos - dos fariseus - juntamente com alguns herodianos, os quais lhe disseram: Mestre. Vede com que espírito retorcido o chamam Mestre; fingem-se seus admiradores e amigos, dispensam-lhe um tratamento que se reserva à autoridade de quem se espera receber um ensinamento. Magister, scimus quia verax es, sabemos que és veraz… Que astúcia tão infame! Já vistes maior duplicidade? Andai por este mundo com cuidado. Não sejais cautelosos, desconfiados; mas deveis sentir sobre os ombros - lembrando-vos da imagem do Bom Pastor que se vê nas catacumbas - o peso dessa ovelha que não é uma alma só, mas a Igreja inteira, a humanidade inteira.

Aceitando com garbo esta responsabilidade, sereis audazes e sereis prudentes para defender e proclamar os direitos de Deus. E então, pela integridade do vosso comportamento, haverá muitos que vos considerarão e vos chamarão mestres, sem vós o pretenderdes, já que não andamos à busca da glória terrena. Mas não vos admireis se, entre tantos que se aproximam de vós, se insinuam esses que só pretendem adular-vos. Gravai nas vossas almas o que me ouvistes repetir tantas vezes: nem as calúnias, nem as murmurações, nem os respeitos humanos, nem o que dirão, e muito menos os louvores hipócritas hão de impedir-nos jamais de cumprir o nosso dever.

Referências da Sagrada Escritura
Referências da Sagrada Escritura