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Há 5 pontos em "Entrevistas com Mons. Josemaria Escrivá ", cuja matéria seja Sacramentos.

A missão dos leigos exerce-se, segundo o Concílio, na Igreja e no mundo. Isto, com freqüência, não é entendido retamente, ficando-se num ou noutro destes termos. Como explicaria a função dos leigos na Igreja e a função que devem realizar no mundo?

Não penso de modo algum que devam considerar-se como duas funções diferentes, tendo em conta que a específica participação do leigo na missão da Igreja consiste, precisamente, em santificar ab intra — de maneira imediata e direta as realidades seculares, a ordem temporal, o mundo.

O que acontece é que, além desta função, que lhe é própria e específica, o leigo tem também — como os clérigos e os religiosos — uma série de direitos, deveres e faculdades fundamentais, que correspondem à sua condição jurídica de fiel, e que têm seu lógico âmbito de exercício no interior da sociedade eclesiástica: participação ativa na liturgia da Igreja, faculdade de cooperar diretamente no apostolado próprio da Hierarquia ou de a aconselhar na sua ação pastoral se for chamado a isso, etc.

Não são estas funções — a específica que corresponde ao leigo e a genérica ou comum que lhe corresponde como fiel — duas funções opostas, mas sim sobrepostas; nem há entre elas contradição, mas sim complementaridade. Reparar só na função específica do leigo, esquecendo a sua simultânea condição de fiel, seria tão absurdo como imaginar um ramo verde e florido que não pertencesse a nenhuma árvore. Esquecer-se do que é específico, próprio e peculiar do leigo, ou não compreender suficientemente as características destas atividades apostólicas seculares e o seu valor eclesial, seria como reduzir a frondosa árvore da Igreja à monstruosa condição de puro tronco.

O Opus Dei ocupa um lugar de primeira plana no processo moderno de evolução do laicato; quereríamos, por isso, perguntar-lhe antes de mais, quais são, em seu entender, as características mais notáveis deste processo.

Sempre pensei que a característica fundamental do processo de evolução do laicato é a consciencialização da dignidade da vocação cristã. O chamado de Deus, o caráter batismal e a graça, fazem que cada cristão possa e deva encarnar plenamente a fé. Cada cristão deve ser alter Christus, ipse Christus — outro Cristo, o próprio Cristo —, presente entre os homens. Disse-o o Santo Padre em termos inequívocos: "É necessário voltar a dar toda a sua importância ao fato de o cristão haver recebido o santo batismo, isto é, ao fato de ter sido enxertado, mediante esse sacramento, no corpo místico de Cristo, que é a Igreja… O fato de ser cristão, de se haver recebido o batismo, não deve ser considerado como indiferente ou sem valor, antes deve marcar profunda e ditosamente a consciência de todo o batizado" (Ecclesiam suam, I).

Na homilia que pronunciou em Pamplona no mês de Outubro passado, durante a Missa que celebrou por ocasião da Assembléia dos Amigos da Universidade de Navarra, o senhor falou do amor humano com palavras que nos comoveram. Muitas leitoras nos escreveram comentando a impressão que sentiram ao ouvi-lo falar assim. Poderia dizer-nos quais são os valores mais importantes do matrimônio cristão?

Vou falar de uma coisa que conheço bem, e que é da minha experiência sacerdotal, de muitos e em muitos países. A maior parte dos sócios do Opus Dei, vive no estado matrimonial e, para eles, o amor humano e os deveres conjugais fazem parte da vocação divina. O Opus Dei fez do matrimônio um caminho divino, uma vocação; e isto tem muitas conseqüências para a santificação pessoal e para o apostolado. Há quase quarenta anos que venho pregando o sentido vocacional do matrimônio. Que olhos cheios de luz vi mais de uma vez quando — julgando eles e elas incompatíveis em sua vida e entrega a Deus e um amor humano nobre e limpo — , me ouviam dizer que o matrimônio é um caminho divino na terra!

O matrimônio existe para que aqueles que o contraem se santifiquem através dele: para isso os cônjuges têm uma graça especial conferida pelo sacramento instituído por Jesus Cristo. Quem é chamado ao estado matrimonial encontra nesse estado — com a graça de Deus — tudo o que necessita para ser santo, para se identificar cada dia mais com Jesus Cristo, e para levar ao Senhor as pessoas com quem convive.

Por isso penso sempre com esperança e com carinho nos lares cristãos, em todas as famílias que brotaram do Sacramento do Matrimônio, que são testemunhos luminosos desse grande mistério divino — sacramentum magnum! (Ef 5, 32), sacramento grande — da união e do amor entre Cristo e a sua Igreja. Devemos trabalhar para que essas células cristãs da sociedade nasçam e se desenvolvam com ânsia de santidade, com a consciência de que o sacramento inicial — o batismo — confere já a todos os cristãos uma missão divina, que cada um deve cumprir no seu próprio caminho.

O esposos cristãos devem ter a consciência de que são chamados a santificar-se santificando, de que são chamados a ser apóstolos, e de que seu primeiro apostolado está no lar. Devem compreender a obra sobrenatural que supõe a fundação de uma família, a educação dos filhos, a irradiação cristã na sociedade. Desta consciência da própria missão dependem, em grande parte, a eficácia e o êxito da sua vida: a sua felicidade.

Mas não esqueçam que o segredo da felicidade conjugal está no quotidiano, não em sonhos. Está em encontrar a alegria escondida de chegarem ao lar; no trato afetuoso com os filhos; no trabalho de todos os dias, em que toda a família colabora; no bom-humor perante as dificuldades, que é preciso enfrentar com esportivismo; é também no aproveitamento de todos os avanços que nos proporciona a civilização, para tornar a casa agradável, a vida mais simples, a formação mais eficaz.

Àqueles que foram chamados por Deus para formar um lar, digo constantemente que se amem sempre, que se amem com aquele amor entusiasmado que tinham quando eram noivos. Pobre conceito tem do matrimônio — que é um sacramento, um ideal e uma vocação — quem pensa que a alegria acaba quando começam as penas e os contratempos que a vida sempre traz consigo. Aí é que o amor se torna forte. As enxurradas das mágoas e das contrariedades não são capazes de afogar o verdadeiro amor: une mais o sacrifício generosamente partilhado. Como diz a Escritura, aquae multae — as muitas dificuldades, físicas e morais — non potuerunt extinguere caritatem (Cant. 8, 7) — não poderão apagar o carinho.

Acabam de escutar a leitura solene dos dois textos da Sagrada Escritura correspondentes à Missa do XXI domingo depois de Pentecostes. Tendo ouvido a Palavra de Deus, ficam já situados no âmbito em que querem mover-se as palavras que agora vou dizer: palavras de sacerdote, pronunciadas perante uma grande família de filhos de Deus em sua Igreja Santa. Palavras, portanto, que desejam ser sobre-naturais, pregoeiras da grandeza de Deus e de suas misericórdias para com os homens: palavras que a todos preparam para a impressionante Eucaristia, que hoje celebramos no campus da Universidade de Navarra.

Considerem por alguns instantes o fato que acabo de mencionar. Celebramos a Sagrada Eucaristia, o sacrifício sacramental do Corpo e Sangue do Senhor, esse mistério de fé que reúne em si todos os mistérios do Cristianismo. Celebramos, portanto, a ação mais sagrada e transcendente que os homens, pela graça de Deus, podem realizar nesta vida. Comungar no Corpo e no Sangue do Senhor vem a ser, em certo sentido, como que desligar-nos de nossos liames de terra e de tempo, para estarmos já com Deus no Céu, onde o próprio Cristo nos enxugará as lágrimas dos olhos e onde não haverá morte, nem pranto, nem gritos de fadiga, porque o mundo velho já terá terminado.

Esta verdade tão consoladora e profunda, este significado escatológico da Eucaristia, como os teólogos costumam denominá-lo, poderia, no entanto, ser mal entendido: e assim aconteceu sempre que se quis apresentar a existência cristã como algo unicamente espiritual — isto é, espiritualista — , próprio de pessoas puras, extraordinárias, que não se misturam com as coisas desprezíveis deste mundo ou que, quando muito, as toleram como algo necessariamente justaposto ao espírito, enquanto aqui vivemos.

Quando se vêem as coisas deste modo, o templo se converte, por antonomásia. no lugar da vida cristã; e, nessa altura, ser cristão é ir ao templo, participar em cerimônias sagradas, incrustar-se numa sociologia eclesiástica, numa espécie de mundo segregado, que se apresenta a si mesmo como ante-câmara do céu, enquanto o mundo comum vai percorrendo o seu caminho. Assim, a doutrina do Cristianismo, a vida da graça, andariam como que roçando o buliçoso avançar da história humana, mas sem se encontrarem com ele.

Nesta manhã de Outubro, enquanto nos preparamos para adentrar-mos no memorial da Páscoa do Senhor, respondemos simplesmente não! a essa visão deformada do Cristianismo. Reparem, por um momento, em como está em emoldurada a nossa Eucaristia, a nossa Ação de Graças: encontramo-nos num templo singular; poderia dizer-se que a nave é o campus universitário; o retábulo, a Biblioteca da Universidade; além, as máquinas que levantam novos edifícios; e, por cima, o céu de Navarra…

Será que esta enumeração não está confirmando, de uma forma plástica e inesquecível, que é a vida corrente o verdadeiro lugar da existência cristã? Meus filhos: aí onde estão nossos irmãos os homens, aí onde estão as nossas aspirações, nosso trabalho, nossos amores — aí está o lugar do nosso encontro cotidiano com Cristo. Em meio das coisas mais materiais da terra é que nós devemos santificar-nos, servindo a Deus e a todos os homens.

O autêntico sentido cristão que professa a ressurreição de toda a carne — sempre combateu, como é lógico, a desencarnação , sem medo de ser tachado de materialista. É lícito, portanto, falar de um materialismo cristão, que se opõe audazmente aos materialismos cerrados ao espírito.

O que são os sacramentos — vestígios da Encarnação do Verbo, como afirmaram os antigos — senão a mais clara manifestação deste caminho escolhido por Deus para nos santificar e levar ao Céu? Não vêem que cada sacramento é o amor de Deus, com toda a sua força criadora e redentora, dando-se a nós através de meios materiais? O que é a Eucaristia — já iminente — senão o Corpo e Sangue adoráveis do nosso Redentor, que se oferece a nós através da humilde matéria deste mundo — vinho e pão — , através dos elementos da natureza, cultivados pelo homem, como o quis recordar o último Concílio Ecumênico?

Assim se compreende, meus filhos, que o Apóstolo chegasse a escrever: Todas as coisas são vossas, vós sois de Cristo e Cristo é de Deus. Trata-se de um movimento ascendente que o Espírito Santo, difundido em nossos corações, quer provocar no mundo; da terra até à glória do Senhor. E para ficar bem claro que — nesse movimento — se incluía também o que parece mais prosaico, São Paulo escreveu ainda: quer comais, quer bebais, fazei tudo para aglória de Deus.