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Há 5 pontos em "É Cristo que passa", cuja matéria seja Apostolado → pôr Cristo no cume das atividades humanas.

Ao falar diante do Presépio, sempre procurei ver Cristo Nosso Senhor desta maneira, envolto em paninhos, sobre a palha de uma mangedoura; e, enquanto ainda é Menino e não diz nada, vê-lo já como Doutor, como Mestre. Preciso considerá-lo assim, porque tenho que aprender dEle. E, para aprender dEle, é necessário conhecer a sua vida: ler o Santo Evangelho, meditar no sentido divino do caminhar terreno de Jesus.

Na verdade, temos que reproduzir em nossa vida a vida de Cristo, conhecendo Cristo à força de ler a Sagrada Escritura e de a meditar, à força de fazer oração, como agora a estamos fazendo diante do Presépio. É preciso entender as lições que nos dá Jesus já desde Menino, desde recém-nascido, desde que seus olhos se abriram para esta bendita terra dos homens.

Jesus, crescendo e vivendo como um de nós, revela-nos que a existência humana, a vida comum e de cada dia, tem um sentido divino. Por muito que tenhamos considerado estas verdades, devemos encher-nos sempre de admiração ao pensar nos trinta anos de obscuridade que constituem a maior parte da vida de Jesus entre seus irmãos, os homens. Anos de sombra, mas, para nós, claros como a luz do Sol. Mais: resplendor que ilumina os nossos dias e que lhes dá uma autêntica projeção, pois somos cristãos comuns, com uma vida vulgar, igual à de tantos milhões de pessoas nos mais diversos lugares do mundo.

Assim viveu Jesus durante seis lustros: era fabri filius, o filho do carpinteiro. Virão depois os três anos de vida pública, com o clamor das multidões. E as pessoas surpreendem-se: Quem é este? Onde aprendeu tantas coisas? Pois a sua vida tinha sido a vida comum do povo da sua terra. Era o faber, filius Mariae, o carpinteiro, filho de Maria. E era Deus; e estava realizando a redenção do gênero humano; e estava a atrair a Si todas as coisas.

Termino com as palavras do Evangelho de hoje: Entrando na casa, viram o Menino com Maria, sua Mãe. Nossa Senhora não se separa do seu Filho. Os Reis Magos não são recebidos por um rei encimado no seu trono, mas por um Menino nos braços de sua Mãe. Peçamos à Mãe de Deus, que é nossa Mãe, que nos prepare o caminho que conduz à plenitude do amor: Cor Mariae dulcissimum, iter para tutum! Seu doce coração conhece o caminho mais seguro para encontrarmos Cristo.

Os Reis Magos tiveram uma estrela; nós temos Maria, Stella maris, Stella Orientis, Estrela do mar, Estrela do Oriente. Hoje dizemos-lhe: Santa Maria, Estrela do mar, Estrela da manhã, ajuda os teus filhos. Nosso zelo pelas almas não deve conhecer fronteiras, porque ninguém está excluído do amor de Cristo. Os Reis Magos foram as primícias dos gentios; mas, uma vez consumada a Redenção, já não há judeu nem grego, não há servo nem livre, não há homem nem mulher - não existe discriminação de espécie alguma -, porque todos vós sois um em Jesus Cristo.

Nós, cristãos, não podemos ser exclusivistas nem separar ou classificar as almas; virão muitos do Oriente e do Ocidente ;todos têm lugar no coração de Cristo. Seus braços - voltamos a admirá-lo no Presépio - são de criança, mas são os mesmos que se abrirão na Cruz, atraindo todos os homens a Si.

E o nosso último pensamento vai para esse homem justo, nosso Pai e Senhor São José, que, como de costume, passa despercebido na cena da Epifania. Adivinho-o recolhido em contemplação, protegendo com amor o Filho de Deus que, feito homem, foi confiado aos seus cuidados paternais. Com a maravilhosa delicadeza de quem não vive para si, o Santo Patriarca excedeu-se num serviço tão silencioso como eficaz.

Falamos hoje da vida de oração e de ânsias de apostolado. Queremos melhor mestre do que São José? Se quiserdes um conselho, que repito incansavelmente há muitos anos, itead Ioseph, recorrei a São José: ele nos mostrará caminhos concretos e modos humanos e divinos de nos aproximarmos de Jesus. E em breve nos atreveremos, como ele, a segurar nos braços, a beijar, vestir e cuidar deste Menino-Deus que para nós nasceu. Com a homenagem da sua veneração, os Magos ofereceram a Jesus ouro, incenso e mirra; José deu-lhe - por inteiro - o seu coração jovem e enamorado.

Instaurare omnia in Christo, é o lema que São Paulo dá aos cristãos de Éfeso informar o mundo inteiro com o espírito de Jesus, colocar Cristo na entranha de todas as coisas. Si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad meipsum , quando for levantado ao alto sobre a terra, tudo atrairei a mim. Cristo, com a sua encarnação, com a sua vida de trabalho em Nazaré, com a sua pregação e milagres pelas terras da Judéia e da Galiléia, com a sua morte na Cruz, com a sua Ressurreição, é o centro da Criação, Primogênito e Senhor de toda a criatura.

Nossa missão de cristãos é proclamar essa realeza de Cristo, anunciá-la com a nossa palavra e as nossas obras. O Senhor quer os seus em todas as encruzilhadas da terra. Chama alguns ao deserto, para que se desentendam dos avatares da sociedade dos homens e com o seu testemunho recordem aos demais que Deus existe. Confia a outros o ministério sacerdotal. Mas quer a grande maioria dos homens no meio do mundo, nas ocupações terrenas. Estes cristãos devem, pois, levar Cristo a todos os ambientes em que desenvolvem as suas tarefas humanas: à fábrica, ao laboratório, ao cultivo da terra, à oficina do artesão, às ruas das grandes cidades e aos caminhos de montanha.

Gosto de recordar a este propósito o episódio da conversa de Cristo com os discípulos de Emaús. Jesus caminha ao lado daqueles dois homens que perderam quase toda a esperança, a tal ponto que a vida começa a parecer-lhes sem sentido. Compreende a sua dor, penetra em seus corações, comunica-lhes um pouco da vida que nEle habita. Quando, ao chegarem à aldeia, Jesus faz menção de continuar viagem, os dois discípulos detêm-no e quase o obrigam a ficar com eles. Reconhecem-no depois, ao partir o pão; o Senhor, exclamam, esteve conosco. Então disseram um para o outro: Não é verdade que sentíamos o coração abrasar-se dentro de nós, enquanto nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?. Cada cristão deve tornar Cristo presente entre os homens; deve viver de tal modo que à sua volta se perceba o bonus odor Christi , o bom odor de Cristo; deve agir de tal modo que, através das ações do discípulo, se possa descobrir o rosto do Mestre.

Nesta festa, em cidades de um extremo ao outro da terra, os cristãos acompanham o Senhor em procissão. Escondido na Hóstia, Ele percorre as ruas e as praças - como na sua vida terrena - saindo ao encontro dos que o querem ver, fazendo-se encontradiço dos que não o procuram. Jesus aparece assim, uma vez mais, no meio dos seus: como reagimos perante essa chamada do Mestre?

As manifestações externas de amor devem nascer do coração e prolongar-se através do testemunho de uma conduta cristã. Se fomos renovados pela recepção do Corpo do Senhor, devemos manifestá-lo com obras. Que os nossos pensamentos sejam sinceros: de paz, de entrega, de serviço. Que as nossas palavras sejam verdadeiras, claras, oportunas; que saibam consolar e ajudar, que saibam sobretudo levar aos outros a luz de Deus. Que as nossas ações sejam coerentes, eficazes, acertadas: que tenham esse bonus odor Christi ,o bom odor de Cristo, por recordarem o seu modo de se comportar e de viver.

A procissão do Corpo de Deus torna Cristo presente nas aldeias e cidades do mundo. Mas essa presença, repito, não deve ser coisa de um dia, ruído que se ouve e se esquece. Essa passagem de Jesus lembra-nos que devemos descobri-lo também nas nossas ocupações habituais. A par da procissão solene desta quinta-feira, deve avançar a procissão silenciosa e simples da vida comum de cada cristão, homem entre os homens, mas feliz de ter recebido a fé e a missão divina de se conduzir de tal modo que renove a mensagem do Senhor sobre a terra. Não nos faltam erros, misérias, pecados. Mas Deus está com os homens, e devemos colocar-nos à sua disposição para que Ele se sirva de nós e se torne contínua a sua passagem entre as criaturas.

Peçamos, pois, ao Senhor que nos conceda a graça de ser almas de Eucaristia, que a nossa relação pessoal com Ele se traduza em alegria, em serenidade, em propósitos de justiça. E assim facilitaremos aos outros a tarefa de reconhecerem Cristo, contribuiremos para colocá-lo no cume de todas as atividades humanas. Cumprir-se-á a promessa de Jesus: Eu, quando for exaltado sobre a terra, tudo atrairei a mim.

Não é um sonho irrealizável ou inútil. Se nós, os homens, nos decidíssemos a albergar o amor de Deus em nossos corações! Cristo, Senhor Nosso, foi crucificado e, do alto da Cruz, redimiu o mundo, restabelecendo a paz entre Deus e os homens. Jesus Cristo recorda a todos: Et ego, si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad meipsum , se vós me colocardes no cume de todas as atividades da terra, cumprindo o dever de cada instante, dando testemunho de mim no que parece grande e no que parece pequeno, omnia traham ad meipsum, tudo atrairei a mim. Meu reino entre vós será uma realidade.

Cristo, Nosso Senhor, continua empenhado nesta semeadura de salvação dos homens e de toda a criação, deste nosso mundo, que é bom porque saiu bom das mãos de Deus. Foi a ofensa de Adão, o pecado da soberba humana, que rompeu a divina harmonia da Criação.

Mas Deus Pai, quando chegou a plenitude dos tempos, enviou seu Filho Unigênito, que, por obra do Espírito Santo, tomou carne em Maria sempre Virgem para restabelecer a paz, para que, redimindo o homem do pecado, adoptionem filiorum reciperemus , fôssemos constituídos filhos de Deus, capazes de participar da intimidade divina; para que assim fosse concedido a este homem novo, a esta nova estirpe dos filhos de Deus , o poder de libertar todo o universo da desordem, restaurando em Cristo todas as coisas , que por Ele foram reconciliadas com Deus.

Foi para isso que nós, os cristãos, fomos chamados, essa é a nossa tarefa apostólica e a preocupação que deve consumir a nossa alma: conseguir que o reino de Cristo se torne realidade, que não haja mais ódios nem crueldades, que estendamos pela terra o bálsamo forte e pacífico do amor. Peçamos hoje ao nosso Rei que nos faça colaborar humilde e fervorosamente com o propósito divino de unir o que se quebrou, de salvar o que está perdido, de ordenar o que o homem desordenou, de levar a seu termo o que se extraviou, de reconstruir a concórdia entre todas as coisas criadas.

Abraçar a fé cristã é comprometer-se a continuar entre as criaturas a missão de Jesus. Cada um de nós tem que ser alter Christus, ipse Christus, outro Cristo, o próprio Cristo. Só assim poderemos empreender essa tarefa grande, imensa, interminável: santificar por dentro todas as estruturas temporais, levando até elas o fermento da Redenção.

Nunca falo de política. Não encaro a tarefa dos cristãos na terra como se tivesse por fim fazer brotar uma corrente político-religiosa - seria uma loucura -, nem mesmo com o bom propósito de infundir o espírito de Cristo em todas as atividades dos homens. O que é preciso situar em Deus é o coração de cada um, seja ele quem for. Procuremos falar a cada cristão, para que lá onde estiver - nas circunstâncias que não dependem apenas da sua posição na Igreja ou na vida civil, mas também do resultado das mutáveis situações históricas -, saiba dar testemunho da fé que professa, com o exemplo e com a palavra.

Por ser homem, o cristão vive no mundo com pleno direito. Se aceitar que Cristo habite em seu coração, que Cristo reine, a eficácia salvadora do Senhor estará intensamente presente em todas as suas ocupações humanas. E não interessa que sejam ocupações altas ou baixas, como se costuma dizer, pois um ápice humano pode ser aos olhos de Deus uma baixeza; e o que chamamos baixo ou modesto pode ser um ápice cristão, de santidade e de serviço.