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Há 3 pontos em "É Cristo que passa", cuja matéria seja Matrimônio → dignidade.

Para um cristão, o matrimônio não é uma simples instituição social, e menos ainda um remédio para as fraquezas humanas: é uma autêntica vocação sobrenatural. Sacramento grande em Cristo e na Igreja, diz São Paulo , e, ao mesmo tempo e inseparavelmente, contrato que um homem e uma mulher estabelecem para sempre, porque - queiramos ou não - o matrimônio instituído por Jesus Cristo é indissolúvel: sinal sagrado que santifica, ação de Jesus que se apossa da alma dos que se casam e os convida a segui-Lo, transformando toda a vida matrimonial em um caminhar divino sobre a terra.

Os casados estão chamados a santificar o seu matrimônio e a santificar-se a si próprios nessa união; por isso, cometeriam um grave erro se edificassem a sua conduta espiritual de costas para o lar, à margem do lar. A vida familiar, as relações conjugais, o cuidado e a educação dos filhos, o esforço necessário para manter a família, para garantir o seu futuro e melhorar as suas condições de vida, o convívio com as outras pessoas que constituem a comunidade social, tudo isso são situações humanas, comuns, que os esposos cristãos devem sobrenaturalizar.

A fé e a esperança têm que manifestar-se na serenidade com que se encaram os problemas, pequenos ou grandes, que surgem em todos os lares, no ânimo alegre com que se persevera no cumprimento do dever. Assim, a caridade inundará tudo e levará a compartilhar as alegrias e os possíveis dissabores, a saber sorrir, esquecendo as preocupações pessoais para atender os demais; a escutar o outro cônjuge ou os filhos, mostrando-lhes que são queridos e compreendidos de verdade; a não dar importância a pequenos atritos que o egoísmo poderia converter em montanhas; a depositar um amor grande nos pequenos serviços de que se compõe a convivência diária.

Santificar o lar, dia a dia; criar, com o carinho, um autêntico ambiente de família: é disso que se trata. Para santificar cada jornada, é preciso praticar muitas virtudes cristãs; em primeiro lugar, as teologais, e depois todas as outras: a prudência, a lealdade, a sinceridade, a humildade, o trabalho, a alegria… Mas no caso do matrimônio, da vida matrimonial, é preciso começar com uma referência clara ao amor dos cônjuges.

Tanto São Mateus como São Lucas nos falam de São José como varão que descendia de uma estirpe ilustre: a de Davi e Salomão, reis de Israel. Historicamente, os detalhes desta ascendência são um pouco confusos, não sabemos qual das duas genealogias enumeradas pelos evangelistas diz respeito a Maria - Mãe de Jesus segundo a carne - e qual a José, que era pai do Senhor segundo a lei judaica. Nem sabemos se a cidade natal de São José era Belém, onde se recenseou, ou Nazaré, onde vivia e trabalhava.

Sabemos, porém, que não era uma pessoa rica: era um trabalhador, como milhões de outros homens em todo o mundo; exercia o ofício fatigante e humilde que Deus havia escolhido para Si ao tomar a nossa carne e ao querer viver trinta anos entre nós como outra pessoa qualquer.

A Sagrada Escritura diz-nos que José era artesão. Vários Padres acrescentam que foi carpinteiro. São Justino, referindo a vida de trabalho de Jesus, afirma que fazia arados e jugos. Baseando-se provavelmente nessas palavras, Santo Isidoro de Sevilha conclui que José era ferreiro. Seja como for, era um operário que trabalhava a serviço de seus concidadãos, que tinha uma habilidade manual, fruto de anos de esforço e de suor.

Das narrações evangélicas depreende-se a grande personalidade humana de José: em nenhum momento surge aos nossos olhos como um homem apoucado ou assustado perante a vida; pelo contrário, sabe enfrentar os problemas, ultrapassar as situações difíceis, assumir com responsabilidade e iniciativa as tarefas que lhe são confiadas.

Não estou de acordo com a forma clássica de representar São José como um ancião, ainda que com isso se tenha tido a boa intenção de ressaltar a perpétua virgindade de Maria. Eu imagino-o jovem, forte, talvez com alguns anos mais do que a Virgem, mas na plenitude da vida e do vigor humano.

Para viver a virtude da castidade, não é preciso esperar pela velhice ou pelo termo das energias. A castidade nasce do amor e, para um amor limpo, nem a robustez nem a alegria da juventude representam qualquer obstáculo. Jovem era o coração e o corpo de São José quando contraiu matrimônio com Maria, quando soube do mistério da sua Maternidade divina, quando viveu junto dEla respeitando a integridade que Deus queria oferecer ao mundo, como um sinal mais da sua vinda às criaturas. Quem não for capaz de entender um amor assim, é porque conhece muito mal o verdadeiro amor e desconhece por completo o sentido cristão da castidade.

Como dizíamos, José era um artesão da Galiléia, um homem como tantos outros. E o que pode esperar da vida um habitante de uma aldeia perdida como Nazaré? Apenas trabalho, todos os dias, sempre com o mesmo esforço. E, no fim da jornada, uma casa pobre e pequena, para recuperar as forças e recomeçar a tarefa no dia seguinte.

Mas o nome de José significa em hebreu Deus acrescentará. A vida santa dos que cumprem a sua vontade, Deus acrescenta dimensões inesperadas: o que a torna importante, o que dá valor a tudo - o divino. À vida humilde e santa de José, Deus acrescentou - se assim me é permitido falar - a vida da Virgem Maria e a de Jesus, Senhor Nosso. Deus nunca se deixa vencer em generosidade. José podia tornar próprias as palavras pronunciadas por Santa Maria, sua Esposa: Quia fecit mihi magna qui potens est, fez em mim coisas grandes Aquele que é Todo-Poderoso, quia respexit humilitatem, porque olhou para a minha pequenez.

José era efetivamente um homem comum, em quem Deus confiou para realizar coisas grandes. Soube viver - tal e como o Senhor queria - todos e cada um dos acontecimentos que compuseram a sua vida. Por isso, a Santa Escritura louva José afirmando dele que era justo. E, na língua hebraica, justo quer dizer piedoso, servidor irrepreensível de Deus, cumpridor da vontade divina ; outras vezes, significa bom e caridoso para com o próximo. Numa palavra, justo é aquele que ama a Deus e demonstra esse amor cumprindo os mandamentos divinos e orientando toda a vida para o serviço de seus irmãos, os homens.

Quem deseja lutar serve-se dos meios adequados. E os meios não mudaram nestes vinte séculos de cristianismo: oração, mortificação e freqüência de Sacramentos. Como a mortificação é também oração - oração dos sentidos -, bastam-nos duas palavras para descrever esses meios: oração e Sacramentos.

Gostaria que considerássemos agora esse manancial de graça divina que são os Sacramentos, maravilhosa manifestação da misericórdia de Deus. Meditemos devagar na definição do Catecismo de São Pio V: determinados sinais sensíveis que causam a graça, e ao mesmo tempo a declaram, como que pondo-a diante dos olhos. Deus Nosso Senhor é infinito, seu amor é inesgotável, sua clemência e sua piedade para conosco não admitem limites. E, embora nos conceda a sua graça de muitas outras maneiras, instituiu expressa e livremente - só Ele o podia fazer - esses sete sinais eficazes, para que de um modo estável, simples e acessível a todos, os homens pudessem participar dos méritos da Redenção.

Se se abandonam os Sacramentos, desaparece a verdadeira vida cristã. Não obstante, sabemos que, particularmente nesta época, não falta quem pareça esquecer - e chegue até a desprezar - esta corrente redentora da graça de Cristo. É doloroso falar desta chaga de uma sociedade que se chama cristã, mas toma-se necessário fazê-lo, para que em nossas almas se firme o desejo de recorrer com mais amor e gratidão a essas fontes de santificação.

Decidem sem o menor escrúpulo adiar o batismo dos recém-nascidos, e assim cometem um grave atentado contra a justiça e contra a caridade, privando esses seres da graça da fé, do tesouro incalculável da inabitação da Santíssima Trindade na alma, que vem ao mundo manchada pelo pecado original. Pretendem também desvirtuar a natureza própria do Sacramento da Crisma, em que a Tradição viu sempre unanimemente um fortalecimento da vida espiritual, uma efusão silenciosa e fecunda do Espírito Santo, para que, sobrenaturalmente robustecida, a alma possa lutar - miles Christi, como soldado de Cristo - nessa batalha interior contra o egoísmo e a concupiscência.

Se se perde a sensibilidade para as coisas de Deus, dificilmente se entenderá também o Sacramento da Penitência. A confissão sacramental não é um diálogo humano, mas um colóquio divino; é um tribunal de segura e divina justiça, e sobretudo de misericórdia, com um juiz amoroso que não deseja a morte do pecador, mas que se converta e viva.

É verdadeiramente infinita a ternura de Nosso Senhor. Reparemos com que delicadeza trata os seus filhos. Fez do matrimônio um vínculo santo, imagem da união de Cristo com a sua Igreja , um grande sacramento em que se alicerça a família cristã, que há de ser, com a graça de Deus, um ambiente de paz e de concórdia, escola de santidade. Os pais são cooperadores de Deus. Daí procede o amável dever de veneração que cabe aos filhos. Com razão se pode chamar o quarto mandamento de dulcíssimo preceito do Decálogo, como escrevi há muitos anos. Quando se vive o matrimônio como Deus quer, santamente, o lar toma-se um recanto de paz, luminoso e alegre.