Lista de pontos

Há 6 pontos em "Amigos de Deus", cuja matéria seja Amor de Deus → oferecimento do trabalho.

Começar é de muitos; acabar, de poucos. E entre esses poucos temos de estar nós, os que procuramos comportar-nos como filhos de Deus. Não o esqueçamos: só as tarefas terminadas com amor, bem acabadas, merecem o aplauso do Senhor que se lê na Sagrada Escritura: É melhor o fim de uma obra do que o seu começo.

Talvez me tenhais ouvido já referir em outras ocasiões um pequeno episódio, que me interessa recordar-vos agora porque é muito gráfico e instrutivo. Certa vez, procurava eu no Ritual Romano a fórmula para benzer a última pedra de um edifício, aquela que é importante, porque resume, como um símbolo, o trabalho duro, esforçado e perseverante de muitas pessoas durante longos anos. Tive uma grande surpresa ao verificar que não existia; era necessário conformar-se com uma benedictio ad omnia, com uma bênção para todas as coisas, genérica. Confesso-vos que me parecia impossível que ocorresse semelhante lacuna, e fui repassando devagar o índice do Ritual. Mas em vão.

Muitos cristãos perderam o convencimento de que a integridade de vida, reclamada pelo Senhor aos seus filhos, exige um autêntico cuidado na realização das tarefas próprias, que devem santificar descendo aos pormenores mais ínfimos.

Não podemos oferecer ao Senhor uma coisa que, dentro das pobres limitações humanas, não seja perfeita, sem mancha, realizada com atenção até nos mínimos detalhes: Deus não aceita trabalhos “marretados”. Não apresentareis nada de defeituoso, admoesta-nos a Escritura Santa, pois não seria digno dEle. Por isso o trabalho de cada qual - essa atividade que ocupa as nossas jornadas e energias - há de ser uma oferenda digna aos olhos do Criador, operatio Dei, trabalho de Deus e para Deus; numa palavra, uma tarefa acabada, impecável.

Temos que evitar o erro de pensar que o apostolado se reduz ao simples testemunho de umas práticas piedosas. Tu e eu somos cristãos, mas ao mesmo tempo, e sem solução de continuidade, cidadãos e trabalhadores, com umas obrigações claras que temos de cumprir de um modo exemplar, se nos queremos santificar de verdade. É Jesus Cristo quem nos incita: Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre um monte; nem acendem uma lucerna e a põem debaixo do alqueire, mas sobre o candeeiro, a fim de que dê luz a todos os que estão em casa. Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai que está nos céus.

O trabalho profissional - seja qual for - converte-se no candeeiro que ilumina os vossos colegas e amigos. Por isso, costumo repetir aos que se incorporam ao Opus Dei, e a minha afirmação é válida para todos os que me escutam: pouco me importa que me digam que fulano é um bom filho meu - um bom cristão -, mas um mau sapateiro! Se não se esforça por aprender bem o seu ofício ou por executá-lo com esmero, não poderá santificá-lo nem oferecê-lo ao Senhor. E a santificação do trabalho ordinário é como que o eixo da verdadeira espiritualidade para os que - imersos nas realidades temporais - estão decididos a ter uma vida de intimidade com Deus.

Possumus!, podemos, podemos vencer também esta batalha, com a ajuda do Senhor. Persuadi-vos de que não é difícil converter o trabalho num diálogo de oração. É só oferecê-lo e pôr mãos à obra, que já Deus nos escuta e nos alenta. Alcançamos o estilo das almas contemplativas, no meio do trabalho cotidiano! Porque nos invade a certeza de que Ele nos olha, ao mesmo tempo que nos pede um novo ato de auto-domínio: esse pequeno sacrifício, o sorriso para a pessoa inoportuna, esse começar pela tarefa menos agradável, mas mais urgente, o cuidar dos pormenores de ordem, com perseverança no cumprimento do dever, quando seria tão fácil abandoná-lo, o não deixar para amanhã o que temos que terminar hoje: tudo para dar gosto a Ele, ao nosso Pai-Deus! E talvez sobre a tua mesa, ou num lugar discreto que não chame a atenção, mas que te sirva como despertador do espírito contemplativo, colocas o crucifixo, que já é para a tua alma e para a tua mente o manual em que aprendes as lições de serviço.

Se te decides - sem esquisitices, sem abandonares o mundo, no meio das tuas ocupações habituais - a enveredar por estes caminhos de contemplação, logo te sentirás amigo do Mestre, com a divina incumbência de abrir as sendas divinas da terra à humanidade inteira. Sim. Com esse teu trabalho, contribuirás para a extensão do reinado de Cristo em todos os continentes. E suceder-se-ão, uma após outra, as horas de trabalho oferecidas pelas longínquas nações que nascem para a fé, pelos povos do Oriente impedidos barbaramente de professar com liberdade as suas crenças, pelos países de antiga tradição cristã, onde parece ter-se obscurecido a luz do Evangelho e as almas se debatem entre as sombras da ignorância… Então, que valor não adquire essa hora de trabalho!, esse continuar com o mesmo empenho por mais algum tempo, por mais alguns minutos, até terminar a tarefa! De um modo prático e simples, convertes a contemplação em apostolado, como uma necessidade imperiosa do coração, que pulsa em uníssono com o dulcíssimo e misericordioso Coração de Jesus, Senhor Nosso.

E como conseguirei - parece que me perguntas - atuar sempre com esse espírito, de modo a concluir com perfeição o meu trabalho profissional? A resposta não é minha; vem de São Paulo: Trabalhai varonilmente e animai-vos mais e mais. Todas as vossas obras sejam feitas em caridade. Fazei tudo por Amor e livremente; não deis nunca lugar ao medo ou à rotina: servi o nosso Pai-Deus.

Gosto muito de repetir - porque tenho boa experiência disso - aqueles versos de pouca arte, mas muito expressivos: Minha vida é toda de amor / e, se em amor sou sabido, / é só por força da dor, / que não há amante melhor / que o que muito tem sofrido*. Ocupa-te dos teus deveres profissionais por Amor; leva a cabo todas as coisas por Amor, insisto, e verificarás - precisamente porque amas, ainda que saboreies a amargura da incompreensão, da injustiça, do desagradecimento e até do próprio fracasso humano - as maravilhas que o teu trabalho produz. Frutos saborosos, semente de eternidade!

(*) Mi vida es toda de amor / y, si en amor estoy ducho, / es por fuerza del dolor, / que no hay amante mejor / que aquel que ha sufrido mucho (N. do T.).

Para alcançarmos esta meta, temos que deixar-nos conduzir pelo Amor, nunca como quem suporta o peso de um castigo ou de uma maldição: Tudo o que fizerdes, em palavras ou em obras, fazei tudo em nome do Senhor Jesus Cristo, dando por Ele graças a Deus Pai. E assim terminaremos os nossos afazeres com perfeição, ocupando plenamente o tempo, porque seremos instrumentos enamorados de Deus, que se apercebem de toda a responsabilidade e de toda a confiança que o Senhor lhes deposita sobre os ombros, apesar da sua fraqueza. Em cada uma das tuas atividades - porque contas com a fortaleza de Deus -, hás de comportar-te como quem se move exclusivamente por Amor.

Mas não fechemos os olhos à realidade, conformando-nos com uma visão ingênua, superficial, que nos dê a idéia de que nos espera um caminho fácil e de que, para percorrê-lo, bastam uns propósitos sinceros e uns desejos ardentes de servir a Deus. Não duvidemos: ao longo dos anos, apresentar-se-ão - talvez antes do que pensamos - situações particularmente custosas, que exigirão muito espírito de sacrifício e um maior esquecimento de nós mesmos. Fomenta, nessa altura, a virtude da esperança e, com audácia, torna teu o grito do Apóstolo: Porque eu tenho por certo que os sofrimentos do tempo presente não têm proporção com a glória vindoura, que se há de manifestar em nós. Medita com segurança e com paz: que será o Amor infinito de Deus derramado sobre esta pobre criatura!

Chegou a hora, no meio das tuas ocupações habituais, de praticar a fé, de despertar a esperança, de avivar o amor; ou seja, de ativar as três virtudes teologais que nos impelem a desterrar imediatamente, sem dissimulações, sem disfarces, sem rodeios, os equívocos que haja na nossa conduta profissional e na nossa vida interior.

Meus amados irmãos - de novo a voz de São Paulo -, sede firmes e constantes, trabalhando sempre cada vez mais na obra do Senhor, sabendo que o vosso trabalho não ficará sem recompensa diante de Deus. Estamos vendo? É toda uma trama de virtudes que se põe em jogo quando desempenhamos o nosso ofício com o propósito de santificá-lo: a fortaleza, para perseverarmos no trabalho, apesar das naturais dificuldades e sem nos deixarmos vencer nunca pelo acabrunhamento; a temperança, para nos gastarmos sem reservas e para superarmos o comodismo e o egoísmo; a justiça, para cumprirmos os nossos deveres para com Deus, para com a sociedade, para com a família, para com os colegas; a prudência, para sabermos em cada caso o que convém fazer e nos lançarmos à obra sem dilações… E tudo, insisto, por Amor, com o sentido vivo e imediato da responsabilidade do fruto do nosso trabalho e do seu alcance apostólico.

Obras é que sãoamores, não as boas razões, reza o ditado popular, e penso que não é necessário acrescentar mais nada.

Senhor, concede-nos a tua graça. Abre-nos a porta da oficina de Nazaré, para que aprendamos a contemplar-te, com a tua Mãe Santa Maria e com o Santo Patriarca José - a quem tanto amo e venero -, dedicados os três a uma vida de trabalho santo. Comover-se-ão os nossos pobres corações, iremos à tua procura e te encontraremos no trabalho cotidiano, que Tu desejas que convertamos em obra de Deus, em obra de Amor.

Referências da Sagrada Escritura
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