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Há 5 pontos em "É Cristo que passa", cuja matéria seja Primeiros cristãos .

Procuramos resumir e comentar alguns traços desses lares em que se reflete a luz de Cristo e que, por isso - repito -, são luminosos e alegres; lares em que a harmonia que reina entre os pais se transmite aos filhos, à família inteira e a todos os ambientes que a acompanham. Assim, em cada família autenticamente cristã, reproduz-se de algum modo o mistério da Igreja, escolhida por Deus e enviada como guia do mundo.

A todo o cristão, seja qual for a sua condição - sacerdote ou leigo, casado ou solteiro -, aplicam-se plenamente as palavras do Apóstolo que se lêem precisamente na Epístola da festa da Sagrada Família: escolhidos de Deus, santos e amados. Isso somos todos, cada um no seu lugar no mundo: homens e mulheres escolhidos por Deus para dar testemunho de Cristo e levar aos que nos rodeiam a alegria de se saberem filhos de Deus, apesar dos nossos erros e procurando lutar contra eles.

É muito importante que nunca falte o sentido vocacional do matrimônio, tanto na catequese e pregação como na consciência daqueles a quem Deus queira nesse caminho, já que estão real e verdadeiramente chamados a incorporar-se aos desígnios divinos de salvação de todos os homens.

Por isso, talvez não se possa propor aos esposos cristãos melhor modelo que o das famílias dos tempos apostólicos: o centurião Cornélio, que foi dócil à vontade de Deus, e em cuja casa se consumou a abertura da Igreja aos gentios ; Áquila e Priscila, que difundiram o cristianismo em Corinto e em Éfeso, e que colaboraram com o apostolado de São Paulo ; Tabita, que com a sua caridade assistiu os necessitados de Jope. E tantos outros lares de judeus e gentios, de gregos e romanos, aos quais chegou a pregação dos primeiros discípulos do Senhor.

Famílias que viveram de Cristo e que deram a conhecer Cristo. Pequenas comunidades cristãs, que atuaram como centros de irradiação da mensagem evangélica. Lares iguais aos outros lares daqueles tempos, mas animados de um espírito novo, que contagiava os que os conheciam e com eles se relacionavam.

Assim foram os primeiros cristãos e assim havemos de ser nós, os cristãos de hoje: semeadores de paz e de alegria, da paz e da alegria que Jesus nos trouxe.

Acabamos de reviver o drama do Calvário, aquilo que me atreveria a chamar a primeira Missa, a primordial, celebrada por Jesus Cristo. Deus Pai entrega seu Filho à morte. Jesus, o Filho Unigênito, abraça-se ao lenho em que haviam de justiçá-lo, e seu sacrifício é aceito pelo Pai; como fruto da Cruz, derrama-se sobre a humanidade o Espírito Santo.

Na tragédia da Paixão, consuma-se a nossa própria vida e toda a história humana. A Semana Santa não pode reduzir-se a uma simples recordação, porque é a consideração do mistério de Jesus Cristo, que se prolonga em nossas almas; o cristão está obrigado a ser alter Christus, ipse Christus, outro Cristo, o próprio Cristo. Pelo Batismo, todos fomos constituídos sacerdotes da nossa própria existência, para oferecer vítimas espirituais, que sejam agradáveis a Deus por Jesus Cristo ,para realizar cada uma de nossas ações em espírito de obediência à vontade de Deus, e assim perpetuarmos a missão do Deus-Homem.

Por contraste, essa realidade nos leva a deter-nos nas nossas desditas, nos nossos erros pessoais. É uma consideração que não nos deve desanimar nem colocar-nos na atitude cética de quem renunciou às grandes esperanças, porque o Senhor reclama-nos tal como somos, para que participemos da sua vida, para que lutemos por ser santos.

A santidade: quantas vezes pronunciamos esta palavra como se fosse um som vazio! Para muitos, chega até a ser um ideal inacessível, um lugar comum da ascética, mas não um fim concreto, uma realidade viva. Não pensavam assim os primeiros cristãos, que usavam o nome de santos para se chamarem entre si, com toda a naturalidade e com grande freqüência: Todos os santos vos saúdam , saudai a todos os santos em Cristo Jesus.

Situados agora perante o momento do Calvário, em que Jesus já morreu e ainda se não manifestou a glória do seu triunfo, temos uma excelente ocasião para examinarmos os nossos desejos de vida cristã, de santidade; para reagirmos com um ato de fé perante as nossas fraquezas e, confiantes no poder de Deus, fazermos o propósito de depositar amor nas coisas do nosso dia-a-dia. A experiência do pecado tem que nos conduzir à dor, a uma decisão mais amadurecida e mais profunda de ser fiéis, de nos identificarmos deveras com Cristo, de perseverar custe o que custar nessa missão sacerdotal que Ele confiou a todos os seus discípulos sem exceção, e que nos impele a ser sal e luz do mundo.

Uma oração ao Deus da minha vida. Se Deus é vida para nós, nada tem de estranho que a nossa existência de cristãos deva estar entretecida de oração. Mas não pensemos que a oração é um ato que se realiza e depois se abandona. O justo compraz-se na lei de Iavé e tende a acomodar-se a essa lei durante o dia e durante a noite. Pela manhã penso em Ti ; e, de tarde, a Ti se eleva minha oração como o incenso. O dia inteiro pode ser tempo de oração: da noite até à manhã e da manhã até à noite. Mais ainda: como nos recorda a Escritura Santa, o próprio sono deve ser oração.

Lembremo-nos do que os Evangelhos nos contam de Jesus. Às vezes, passava a noite inteira ocupado num colóquio íntimo com seu Pai. Como cativou os primeiros discípulos a figura de Cristo em oração! Depois de contemplarem esta atitude constante do Mestre, pedem-lhe: Domine, doce nos orare , Senhor, ensina-nos a orar assim.

São Paulo - oratione instantes , contínuos na oração, escreve - difunde por toda a parte o exemplo vivo de Cristo. E São Lucas, numa pincelada, retrata a maneira de agir dos primeiros fiéis: Animados de um mesmo espírito, perseveravam juntos na oração.

A têmpera do bom cristão adquire-se, mediante a graça, na forja da oração. E, por ser vida, este alimento que é a oração não segue uma trilha única. O coração saberá desafogar-se habitualmente, por meio de palavras, nessas orações vocais ensinadas pelo próprio Deus - o Pai Nosso - ou por seus anjos - a Ave Maria. Outras vezes, utilizaremos orações acrisoladas pelo tempo, nas quais se verteu a piedade de milhões de irmãos na fé: as da liturgia - lex orandi -, ou as que nasceram do ardor de um coração enamorado, como tantas antífonas marianas: Sub tuum praesidium…, Memorare…, Salve Regina…

Em outras ocasiões, serão suficientes duas ou três expressões lançadas ao Senhor como setas, iaculata:jaculatórias, que aprendemos na leitura atenta da história de Cristo: Domine, si vis potes me mundare - Senhor, se quiseres, podes curar-me; Domine, tu omnia nosti, tu scis quia amo te - Senhor, Tu sabes tudo, Tu sabes que eu te amo; Credo, Domine, sed adiuva incredulitatem meam - Creio, Senhor, mas ajuda a minha incredulidade, fortalece a minha fé; Domine, non sum dignus - Senhor, não sou digno!; Dominus meus et Deus meus - Meu Senhor e meu Deus!… Ou outras frases, breves e afetuosas, que brotam do fervor íntimo da alma e correspondem a circunstancias particulares.

A vida de oração deve apoiar-se, além disso, em alguns minutos diários dedicados exclusivamente ao trato com Deus. São momentos de colóquio sem ruído de palavras, junto do Sacrário sempre que possível, para agradecer ao Senhor por essa espera - como está só! - de vinte séculos. A oração mental é esse diálogo com Deus, de coração a coração, em que intervém a alma toda: a inteligência e a imaginação, a memória e a vontade. É uma meditação que contribui para dar valor sobrenatural à nossa pobre vida humana, à nossa vida diária e corrente.

Graças a esses momentos de meditação, às orações vocais, às jaculatórias, saberemos converter o nosso dia num contínuo louvor a Deus, sempre com naturalidade e sem espetáculo. Assim, à semelhança dos enamorados, que não tiram nunca os sentidos da pessoa que amam, manter-nos-emos sempre na sua presença; e todas as nossas ações - mesmo as mais pequenas e insignificantes - transbordarão de eficácia espiritual.

Por isso, quando um cristão envereda por este caminho de intimidade ininterrupta com o Senhor - e é um caminho para todos, não uma senda para privilegiados -, a vida interior cresce, segura e firme; e o homem consolida-se nessa luta, simultaneamente amável e exigente, por realizar até o fundo a vontade de Deus.

A partir da vida de oração, podemos entender esse outro tema que a festa de hoje nos propõe: o apostolado, a realização dos ensinamentos de Jesus transmitidos aos Apóstolos pouco antes de subir aos céus: Vós me servireis de testemunhas em Jerusalém e em toda a Judéia e Samaria e até os confins do mundo.

Viver segundo o Espírito Santo é viver de fé, de esperança, de caridade: é deixar que Deus tome posse de nós e mude pela raiz os nossos corações, para os moldar à sua medida. Uma vida cristã amadurecida, profunda e rija, não é coisa que se improvise, porque é fruto do crescimento da graça de Deus em nós. Nos Atos dos Apóstolos, descreve-se a situação da primitiva comunidade cristã numa frase breve, mas cheia de sentido: Perseveravam todos na doutrina dos Apóstolos, na participação da fração do pão e na oração.

Foi assim que viveram os primeiros cristãos, e é assim que devemos nós viver: a meditação da doutrina da fé, até a fazermos própria; o encontro com Cristo na Eucaristia; o diálogo pessoal - a oração sem anonimato - face a face com Deus, devem constituir como que a substância última da nossa conduta. Se isso faltar, talvez haja reflexão erudita, atividade mais ou menos intensa, devoções e práticas de piedade. Mas não haverá existência cristã autêntica, porque faltará a compenetração com Cristo, a participação real na obra divina da salvação.

É uma doutrina que se aplica a qualquer cristão, porque todos fomos igualmente chamados à santidade. Não há cristãos de segunda categoria, obrigados a pôr em prática apenas uma versão reduzida do Evangelho: todos recebemos o mesmo Batismo e, se bem que exista uma ampla diversidade de carismas e de situações humanas, um só é o Espírito que distribui os dons divinos, uma só a fé, a esperança, a caridade.

Podemos, pois, tomar como dirigida a nós a pergunta do Apóstolo: Não sabeis que sois templo de Deus e que o Espírito Santo habita em vós? , e recebê-la como convite para uma relação mais pessoal e direta com Deus. Infelizmente, para alguns cristãos, o Paráclito é o Grande Desconhecido: um nome que se pronuncia, mas que não é Alguém - uma das três Pessoas do único Deus -, com quem se fala e de quem se vive.

Ora, é preciso que procuremos a sua intimidade com assídua simplicidade e com confiança, como a Igreja nos ensina a fazê-lo através da Liturgia. Assim conheceremos melhor a Deus e ao mesmo tempo compreenderemos mais plenamente o imenso dom que significa chamar-se cristão: compreenderemos toda a grandeza e toda a verdade desse endeusamento, dessa participação na vida divina a que antes me referia.

Porque o Espírito Santo não é um artista que desenhe em nós a divina substância, como se fosse alheio a ela; não é assim que nos conduz à semelhança divina. Sendo Deus e procedendo de Deus, Ele mesmo se imprime nos corações que o recebem, como o selo sobre a cera e, dessa forma, pela comunicação de si mesmo e pela semelhança, restabelece a natureza consoante a beleza do modelo divino e restitui ao homem a imagem de Deus.

Jesus esconde-se no Santíssimo Sacramento do altar para que nos atrevamos a procurar a sua companhia, para ser nosso sustento, e para que assim nos tornemos uma só coisa com Ele. Quando disse: Sem mim, nada podeis fazer , não condenou o cristão à ineficácia nem o obrigou a uma busca árdua e difícil da sua Pessoa. Ficou entre nós com uma disponibilidade total.

Nos momentos em que nos reunimos diante do altar, enquanto se celebra o Santo Sacrifício da Missa, quando contemplamos a Sagrada Hóstia exposta no ostensório ou a adoramos escondida no Sacrário, devemos reavivar a nossa fé, pensar na nova existência que vem até nós, e comover-nos perante o carinho e a ternura de Deus.

E perseveravam todos na doutrina dos Apóstolos, na comunicação da fração do pão e nas orações. É assim que as Escrituras nos descrevem a conduta dos primeiros cristãos: congregados pela fé dos Apóstolos em perfeita unidade, ao participarem da Eucaristia; unânimes na oração. Fé, Pão, Palavra.

Jesus na Eucaristia é penhor firme da sua presença em nossas almas; do seu poder, que sustenta o mundo; das suas promessas de salvação, que ajudarão a família humana a habitar perpetuamente na casa do céu, quando chegar o fim dos tempos, em torno de Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo: Trindade Beatíssima, Deus Único. É toda a nossa fé que se põe em movimento quando cremos em Jesus, na sua presença real sob os acidentes do pão e do vinho.