Lista de pontos

Há 3 pontos em "É Cristo que passa", cuja matéria seja Fraternidade → mandamento novo .

Recordar a um cristão que a sua vida não tem outro sentido senão o de obedecer à vontade divina não é separá-lo dos outros homens. Pelo contrário: em muitos casos, o mandamento recebido do Senhor é que nos amemos uns aos outros como Ele nos amou vivendo junto dos outros e tal como os outros,entregando-nos ao serviço do Senhor no mundo, para dar a conhecer melhor a todas as almas o amor de Deus; para Lhes dizer que se abriram os caminhos divinos da terra.

O Senhor não se limitou a dizer que nos amava, mas demonstrou-o com obras. Não esqueçamos que Jesus Cristo se encarnou para ensinar, para que aprendamos a viver a vida dos filhos de Deus. Recordemos o preâmbulo do evangelista São Lucas nos Atos dos Apóstolos: Primum quidem sermonem feci de omnibus, ó Theophile, quae coepit Jesus facere et docere, falei de tudo o que de mais notável Jesus fez e pregou. Veio ensinar, mas fazendo; veio ensinar, mas sendo modelo, sendo o mestre e o exemplo com a sua conduta.

Agora, diante de Jesus Menino, podemos continuar o nosso exame pessoal: estamos decididos a procurar que a nossa vida sirva de modelo e ensinamento aos nossos irmãos, aos nossos iguais, os homens? Estamos decididos a ser outros Cristos?

Não é suficiente dizê-lo com a boca. Tu - pergunto-o a cada um de vós e pergunto-o a mim mesmo - tu, que por seres cristão és convidado a ser outro Cristo, mereces que se repita de ti que vieste facere et docere, fazer tudo como um Filho de Deus, atento à vontade de seu Pai, para que deste modo possas levar todas as almas a participarem das coisas boas, nobres, divinas e humanas da Redenção? Estás vivendo a vida de Jesus Cristo na tua vida habitual no meio do mundo?

Fazer as obras de Deus não é um bonito jogo de palavras, mas um convite a gastar-se por Amor. Temos que morrer para nós mesmos, a fim de renascermos para uma vida nova. Porque assim obedeceu Jesus, até à morte de Cruz, mortem autem crucis. Propter quod et Deus exaltavit illum, Por isso Deus o exaltou. Se obedecermos à vontade de Deus, a Cruz será também Ressurreição, exaltação. Cumprir-se-á em nós, passo a passo, a vida de Cristo; poder-se-á afirmar que vivemos procurando ser bons filhos de Deus, que passamos fazendo o bem, apesar da nossa fraqueza e dos nossos erros pessoais, por mais numerosos que tenham sido.

E quando vier a morte, que virá inexoravelmente, esperá-la-emos com júbilo, como tenho visto que o souberam fazer tantas pessoas santas no meio da sua existência diária. Com alegria, porque, se imitarmos Cristo em fazer o bem - em obedecer e levar a Cruz, apesar das nossas misérias - ressuscitaremos como Cristo: Surrexit Dominus vere!, que ressuscitou realmente.

Jesus, que se fez menino - meditemos -, venceu a morte. Pelo aniquilamento, pela simplicidade, pela obediência, pela divinização da vida comum e vulgar das criaturas, o Filho de Deus foi vencedor!

Este foi o triunfo de Jesus Cristo. Assim nos elevou ao seu nível, ao nível dos filhos de Deus, descendo ao nosso terreno, ao terreno dos filhos dos homens.

O cristão sabe-se enxertado em Cristo pelo Batismo; habilitado a lutar por Cristo, pela Confirmação; chamado a atuar no mundo pela participação na função real, profética e sacerdotal de Cristo; transformado numa só coisa com Cristo pela Eucaristia, sacramento da unidade e do amor. Por isso, como Cristo, deve viver de rosto voltado para os outros homens, olhando com amor para todos e cada um dos que o rodeiam, para a humanidade inteira.

A fé leva-nos a reconhecer Cristo como Deus, a vê-lo como nosso Salvador, a identificar-nos com Ele, agindo como Ele agiu. O Ressuscitado, depois de tirar o Apóstolo Tomé de suas dúvidas, mostrando-lhe as chagas, exclama: Bem-aventurados os que não me viram e creram.E São Gregório Magno comenta: Aqui fala-se de nós de um modo particular, porque nós possuímos espiritualmente Aquele a quem não vimos corporalmente. Fala-se de nós, mas com a condição de que as nossas ações estejam de acordo com a nossa fé. Não crê verdadeiramente senão aquele que na sua conduta põe em prática o que crê. Por isso diz São Paulo daqueles que da fé só possuem palavras: professam conhecer Deus, mas negam-no com as obras.

Não é possível separar em Cristo o seu ser de Deus-Homem da sua função de Redentor. O Verbo se fez carne e veio à terra ut omnes homines salvi fiant , para salvar todos os homens. Com todas as nossas misérias e limitações pessoais, somos outros Cristos, o próprio Cristo, chamados também a servir a todos os homens.

É necessário que ressoe muitas vezes aquele mandamento que continuará a ser novo através dos séculos. Caríssimos - escreve São João -, não pretendo escrever-vos um mandamento novo, mas um mandamento antigo, que recebestes desde o começo; o mandamento antigo é a palavra divina que ouvistes. E, não obstante, eu vos digo que o mandamento de que vos falo é um mandamento novo, que é verdadeiro em si mesmo e em vós, porque as trevas desapareceram e brilha já a luz verdadeira. Quem diz estar na luz, e aborrece seu irmão, está ainda em trevas. Quem ama o seu irmão mora na luz e nele não existe escândalo.

O Senhor veio trazer a paz, a boa nova, a vida, a todos os homens. Não apenas aos ricos, nem apenas aos pobres. Não apenas aos sábios, nem apenas à gente simples. A todos. Aos irmãos que somos, pois somos filhos de um mesmo Pai Deus. Não existe, pois, senão uma raça: a raça dos filhos de Deus. Não existe mais do que uma cor: a cor dos filhos de Deus. E não existe senão uma língua: essa que, falando ao coração e à cabeça, sem ruído de palavras, nos dá a conhecer Deus e faz com que nos amemos uns aos outros.

Compreende-se muito bem a impaciência, a angústia e os anseios inquietos daqueles que, com alma naturalmente cristã , não se resignam perante as situações de injustiça pessoal e social que o coração humano é capaz de criar. Tantos séculos de convivência entre os homens, e ainda tanto ódio, tanta destruição, tanto fanatismo acumulado em olhos que não querem ver e em corações que não querem amar.

Os bens da terra, repartidos entre poucos; os bens da cultura, encerrados em cenáculos. E, lá fora, fome de pão e de sabedoria; vidas humanas - que são santas, porque vêm de Deus - tratadas como simples coisas, como números de uma estatística. Compreendo e partilho dessa impaciência, levantando os olhos para Cristo, que continua a convidar-nos a pôr em prática o mandamento novo do amor.

Todas as situações por que a nossa vida atravessa nos trazem uma mensagem divina, pedem-nos uma resposta de amor, de entrega aos outros. Quando vier o Filho do homem em toda a sua majestade e acompanhado de todos os seus anjos, sentar-se-á no trono da sua glória e fará comparecer diante de si todas as nações, e separará uns dos outros, como o pastor separa as ovelhas dos cabritos, pondo as ovelhas à sua direita e os cabritos à esquerda.

Então o rei dirá aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu pai, tomai posse do reino que vos está preparado desde o princípio do mundo. Porque tive fome e me destes de comer; tive sede, e me destes de beber; era peregrino, e me hospedastes; estava nu, e me vestistes; doente, e me visitastes; preso, e viestes ver-me. Ao que os justos lhe responderão: Senhor, quando te vimos com fome, e te demos de comer; com sede, e te demos de beber; quando te vimos peregrino, e te hospedamos; nu, e te vestimos; ou quando te vimos doente ou na prisão, e te fomos visitar? E o rei, em resposta, dir-lhes-á: na verdade vos digo, sempre que o fizestes a um destes meus irmãos mais pequenos, a mim o fizestes.

Temos que reconhecer Cristo que nos sai ao encontro nos nossos irmãos, os homens. Nenhuma vida humana é uma vida isolada, mas entrelaça-se com as outras vidas. Nenhuma pessoa é um verso solto: fazemos todos parte de um mesmo poema divino, que Deus escreve com o concurso da nossa liberdade.