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Há 4 pontos em "Amigos de Deus", cuja matéria seja Humildade → humildade e caridade.

Se vos examinardes com valentia, na presença de Deus, encontrar-vos-eis, como eu, diariamente carregados de muitos erros. Quando se luta por tirá-los, com a ajuda divina, esses erros deixam de ter uma importância decisiva e se vencem, ainda que pareça que nunca se consegue desarraigá-los por completo.

Além disso, por cima dessas fraquezas, contribuirás para remediar as grandes deficiências dos outros, sempre que te empenhes em corresponder à graça de Deus. Se te reconheces tão fraco como eles - capaz de todos os erros e de todos os horrores* -, serás mais compreensivo, mais delicado e, ao mesmo tempo, mais exigente, para que todos nós nos decidamos a amar a Deus com o coração inteiro.

Nós, os cristãos, os filhos de Deus, temos que assistir os outros, levando à prática com honradez o que aqueles hipócritas sussurravam avessamente ao Mestre: Não atendes à qualidade das pessoas. Quer dizer, repeliremos por completo a discriminação de pessoas - interessam-nos todas as almas! -, ainda que logicamente tenhamos de começar por ocupar-nos daquelas que, por uma circunstância ou outra - também por motivos aparentemente humanos -, Deus colocou ao nosso lado.

(*) No original: de todos los errores y de todos los horrores, expressão que foneticamente não tem tradução análoga em português (N. do T.).

Uma das suas primeiras manifestações traduz-se em iniciar a alma nos caminhos da humildade. Quando sinceramente nos consideramos nada; quando compreendemos que, sem o auxílio divino, a mais débil e fraca das criaturas seria melhor que nós; quando nos reconhecemos capazes de todos os erros e de todos os horrores; quando nos sabemos pecadores, embora lutemos com empenho por afastar-nos de tantas infidelidades - como havemos de pensar mal dos outros? Como podemos alimentar no coração o fanatismo, a intolerância, a altivez presunçosa?

A humildade leva-nos como que pela mão a essa forma de tratar o próximo que é sem dúvida a melhor: a de compreender a todos, conviver com todos, desculpar a todos; a de não criar divisões nem barreiras; a de comportar-nos - sempre! - como instrumentos de unidade. Não em vão existe no fundo do homem uma aspiração forte à paz, à união com os seus semelhantes, ao mútuo respeito dos direitos da pessoa, de maneira que esse respeito se transforme em fraternidade. É o reflexo de um dos traços mais valiosos da nossa condição humana: se todos somos filhos de Deus, a fraternidade nem se reduz a um lugar-comum nem é um ideal ilusório: sobressai como meta difícil, mas real.

Em face de todos os cínicos, dos céticos, dos desamorados, dos que converteram a sua própria covardia numa mentalidade, nós, os cristãos, temos que demonstrar que esse carinho é possível. Talvez haja muitas dificuldades para nos comportarmos assim, porque o homem foi criado livre e tem o poder de desafiar inútil e amargamente o próprio Deus. Mas é algo possível e real, porque essa conduta nasce necessariamente do amor de Deus e do amor a Deus. Se tu e eu queremos, Jesus Cristo também o quer. Então compreendemos em toda a sua profundidade e em toda a sua fecundidade a dor, o sacrifício e a desinteressada entrega de nós mesmos na convivência diária.

Já nos convencemos de que a caridade nada tem a ver com essa caricatura que às vezes se tem pretendido fazer da virtude central da vida do cristão. Então, por que a necessidade de pregá-la continuamente? Será que é um tema obrigatório, mas com poucas possibilidades de se manifestar em fatos concretos?

Se olharmos ao nosso redor, talvez achemos razões para pensar que a caridade é uma virtude ilusória. No entanto, considerando as coisas com sentido sobrenatural, descobriremos também a raiz dessa esterilidade: a ausência de uma vida de relação intensa e contínua, de tu a Tu, com Nosso Senhor Jesus Cristo; e o desconhecimento da obra do Espírito Santo na alma, cujo primeiro fruto é precisamente a caridade.

Citando uns conselhos do Apóstolo - Levai uns as cargas dos outros e assim cumprireis a lei de Cristo -, acrescenta um Padre da Igreja: Se amarmos a Cristo, suportaremos facilmente a fraqueza dos outros, mesmo a daquele que ainda não amamos por não ter obras boas.

É assim que se vai elevando o caminho que nos faz crescer na caridade. Se pensássemos que devemos primeiro ocupar-nos em atividades humanitárias, em obras assistenciais, excluindo o amor do Senhor, estaríamos enganados. Não descuidemos Cristo por causada preocupação pelo próximo enfermo, já que devemos amar o enfermo por causa de Cristo.

Olhai constantemente para Jesus, que, sem deixar de ser Deus, se humilhou tomando a forma de servo para poder servir-nos, porque só seguindo nessa mesma direção é que despertam os anseios que valem a pena. O amor busca a união, procura identificar-se com a pessoa amada; e, ao unir-nos a Cristo, suscita em nós a ânsia de secundar a sua vida de entrega, de amor incomensurável, de sacrifício até a morte. Cristo situa-nos perante o dilema definitivo: ou consumirmos a nossa existência de forma egoísta e solitária; ou dedicarmo-nos com todas as forças a uma tarefa de serviço.

Para terminar este tempo de conversa com o Senhor, vamos pedir-lhe agora que nos conceda a graça de repetir, com São Paulo, que triunfamos pela virtude dAquele que nos amou. Razão pela qual estou certo de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as virtudes, nem o presente, nem o futuro, nem a força, nem o que há de mais alto ou de mais profundo, nem qualquer outra criatura poderá jamais separar-nos do amor de Deus, que está em Jesus Cristo, Nosso Senhor.

É deste amor que a Escritura canta também com palavras ardentes: As águas copiosas não puderam extinguir a caridade, nem os rios arrastá-la. Foi este amor que cumulou sempre o Coração de Santa Maria, até enriquecê-la com entranhas de Mãe para com a humanidade inteira. Na Virgem, o amor a Deus confunde-se também com a solicitude por todos os seus filhos. O seu Coração dulcíssimo, atento até aos menores detalhes - não têm vinho -, deve ter sofrido muito ao presenciar aquela crueldade coletiva, aquele encarniçamento que foi, da parte dos verdugos, a Paixão e Morte de Jesus. Mas Maria não fala. Como seu Filho, ama, cala e perdoa. Essa é a força do amor.