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Há 5 pontos em "Amigos de Deus", cuja matéria seja Vida sobrenatural  → necessidade de uma pureza santa .

Sabeis perfeitamente, porque o ouvistes e meditastes com freqüência, que Jesus Cristo é o nosso modelo, o modelo de todos os cristãos. Assim o ensinastes, além disso, a tantas almas, nesse apostolado - relacionamento humano com sentido divino - que já faz parte do vosso eu; e assim o recordastes, quando era conveniente, servindo-vos desse meio maravilhoso que é a correção fraterna, para que a pessoa que vos escutava comparasse o seu comportamento com o do nosso Irmão primogênito, o Filho de Maria, Mãe de Deus e Mãe nossa.

Jesus é o modelo. Disse-o Ele: Discite a me, aprendei de Mim. E hoje desejo falar-vos de uma virtude que, sem ser a única nem a primeira, no entanto, atua na vida cristã como o sal que preserva da corrupção, e que constitui a pedra de toque para a alma apostólica: a virtude da santa pureza.

A caridade teologal surge-nos, sem dúvida, como a mais alta das virtudes. Mas a castidade é o meio sine qua non, uma condição imprescindível para se atingir o diálogo íntimo com Deus. E quando não é observada, quando não se luta, acaba-se cego; não se vê nada, porque o homem animal não pode perceber as coisas que são do Espírito de Deus.

Nós queremos olhar com olhos limpos, animados pela pregação do Mestre: Bem-aventurados os que têm o coração puro, porque verão a Deus. A Igreja apresentou sempre estas palavras como um convite à castidade. Guardam um coração sadio, escreve São João Crisóstomo, os que possuem uma consciência completamente limpa ou os que amam a castidade. Nenhuma virtude é tão necessária como esta para ver a Deus.

Olhai que quem está podre, pela concupiscência da carne, espiritualmente não consegue andar, é incapaz de uma obra boa, é um aleijado que permanece jogado a um canto como um trapo. Não vistes esses pacientes com paralisia progressiva, que não conseguem valer-se nem pôr-se em pé? Às vezes, nem sequer mexem a cabeça. É o que acontece no terreno sobrenatural com os que não são humildes e se entregam covardemente à luxúria. Não vêem, nem ouvem, nem entendem nada. Estão paralíticos e como que enlouquecidos.

Cada um de nós deve invocar o Senhor, a Mãe de Deus, e suplicar que nos concedam a humildade e a decisão de aproveitar com piedade o divino remédio da Confissão. Não permitais que se aninhe na vossa alma um foco de podridão, por muito pequeno que seja. Falai. Quando a água corre, é límpida; quando se estanca, forma um charco cheio de porcaria repugnante, e de água potável converte-se em caldo de bichos.

Que a castidade é possível e que constitui uma fonte de alegria, vós o sabeis como eu; também é do vosso conhecimento que exige de vez em quando um pouco de luta. Escutemos de novo São Paulo: Deleito-me na lei de Deus segundo o homem interior, mas ao mesmo tempo vejo outra lei em meus membros, que resiste ao meu espírito e me subjuga à lei do pecado, que está nos membros do meu corpo. Como sou um homem infeliz! Quem me livrará deste corpo de morte? Grita tu mais, se precisas, mas não exageremos: Sufficit tibi gratia mea, basta-te a minha graça, responde-nos Nosso Senhor.

Já tive ocasião de perceber como brilhavam os olhos de um esportista diante dos obstáculos que devia ultrapassar. Que vitória! Observai como domina essas dificuldades! Assim nos contempla Deus Nosso Senhor, que ama a nossa luta: sempre seremos vencedores, porque Ele não nos nega nunca a onipotência da sua graça. E então pouco importa que haja contenda, porque Ele não nos abandona.

É combate, mas não renúncia. Respondemos com uma afirmação gozosa, com uma entrega livre e alegre. O teu comportamento não há de limitar-se a evitar a queda, a ocasião. Não há de reduzir-se de maneira nenhuma a uma negação fria e matemática. Já te convenceste de que a castidade é uma virtude e de que, como tal, deve crescer e aperfeiçoar-se? Não basta, insisto, sermos continentes, cada um segundo o seu estado: temos de viver castamente, com virtude heróica. Esta virtude comporta um ato positivo, pelo qual aceitamos de boa vontade o apelo divino: Praebe, fili mi, cor tuum mihi et oculi tui vias meas custodiant, entrega-me, meu filho, o teu coração, e estende o teu olhar pelos meus campos de paz.

E agora eu te pergunto: Como é que enfrentas esta peleja? Bem sabes que a luta, se a manténs desde o princípio, já está vencida. Afasta-te imediatamente do perigo, logo que percebas as primeiras chispas da paixão, e mesmo antes. Fala, além disso, imediatamente com quem dirige a tua alma; melhor antes, se for possível, porque, se abrirmos o coração de par em par, não seremos derrotados. Um ato e outro formam um hábito, uma inclinação, uma facilidade. Por isso é necessário batalhar para alcançar o hábito da virtude, o hábito da mortificação, para não repelir o Amor dos amores.

Meditai no conselho de São Paulo a Timóteo - te ipsum castum custodi, conserva-te casto -, para que também nós estejamos sempre vigilantes, decididos a guardar esse tesouro que Deus nos entregou. Ao longo da minha vida, quantas pessoas não ouvi exclamarem: Ai, se tivesse cortado logo no princípio! E diziam-no cheias de aflição e vergonha.

Vejamos com que recursos contamos sempre, nós, os cristãos, para vencer nesta luta por guardar a castidade: não como anjos, mas como mulheres e homens sadios, fortes, normais! Venero com toda a alma os anjos, e uma grande devoção me une a esse exército de Deus. Mas não gosto de me comparar a eles, porque os anjos têm uma natureza diferente da nossa e essa equiparação significaria uma desordem.

Em muitos ambientes, generalizou-se um clima de sensualidade que, unido à confusão doutrinal, leva muitos a justificar qualquer aberração ou, ao menos, a demonstrar a tolerância mais indiferente por todo o tipo de costumes licenciosos.

Temos de ser o mais limpos que pudermos, com respeito pelo corpo, sem medo, porque o sexo é coisa santa e nobre - participação no poder criador de Deus -, feito para o matrimônio. E assim, limpos e sem medo, dareis com a vossa conduta o testemunho da possibilidade e da formosura da santa pureza.

Em primeiro lugar, empenhar-nos-emos em afinar a nossa consciência, aprofundando até onde for necessário para termos a certeza de haver adquirido uma boa formação, distinguindo bem entre a consciência delicada - autêntica graça de Deus - e a consciência escrupulosa, que é coisa diferente.

Cuidai da castidade com esmero, e também dessas outras virtudes que formam o seu cortejo - a modéstia e o pudor -, que vêm a ser como que a sua salvaguarda. Não passeis com ligeireza por cima dessas normas que são tão eficazes para nos conservarmos dignos do olhar de Deus: a guarda atenta dos sentidos e do coração; a valentia - a valentia de ser covarde - para fugir das ocasiões; a freqüência dos sacramentos, de modo particular a Confissão sacramental; a sinceridade plena na direção espiritual pessoal; a dor, a contrição, a reparação depois das faltas. E tudo ungido com uma terna devoção a Nossa Senhora, para que Ela nos obtenha de Deus o dom de uma vida santa e limpa.

Se por desgraça se cai, é preciso levantar-se imediatamente. Com a ajuda de Deus, que não faltará se nos servirmos dos meios, deve chegar-se quanto antes ao arrependimento, à sinceridade humilde, à reparação, de modo que a derrota momentânea se transforme numa grande vitória de Jesus Cristo.

Acostumai-vos também a levar a luta a pontos que estejam longe dos muros capitais da fortaleza. Não se pode andar fazendo equilíbrios nas fronteiras do mal: temos de evitar com firmeza o voluntário in causa*, temos de repelir mesmo o menor desamor; e temos de fomentar as ânsias de um apostolado cristão, contínuo e fecundo, que necessita da santa pureza como alicerce e também como um dos seus frutos mais característicos. Além disso, devemos preencher as horas com um trabalho intenso e responsável, procurando a presença de Deus, porque não devemos esquecer nunca que fomos comprados por um grande preço e que somos templo do Espírito Santo.

E que outros conselhos vos sugiro? Os recursos de que sempre se valeram os cristãos que pretendiam de verdade seguir Cristo, os mesmos que empregaram aqueles primeiros que perceberam o respirar de Jesus: o trato assíduo com o Senhor através da Eucaristia, a invocação filial à Santíssima Virgem, a humildade, a temperança, a mortificação dos sentidos - porque não convém olhar para o que não é lícito desejar, advertia São Gregório Magno - e a penitência.

Dir-me-eis que tudo isso é nada menos que um resumo da vida cristã. Realmente, não é possível separar a pureza, que é amor, da essência da nossa fé, que é caridade, o renovado enamorar-se de Deus que nos criou, que nos redimiu e que nos toma continuamente pela mão, ainda que numa multidão de ocasiões não o percebamos. Ele não nos pode abandonar. Dizia Sião: O Senhor abandonou-me, o Senhor esqueceu-se de mim. Pode a mulher esquecer-se do fruto do seu ventre, não se compadecer do filho das suas entranhas? Pois ainda que ela se esquecesse, Eu não te esquecerei. Estas palavras não vos infundem um júbilo imenso?

(*) A expressão voluntário “in causa” é utilizada pela teologia moral para significar a responsabilidade por pecados que, embora não sejam diretamente queridos, decorrem como efeito de outra ação voluntária. Nestes casos, quem quer a causa é moralmente responsável pelos efeitos que ela previsivelmente podia produzir (N. do T.).